Os dados de 1 ano dos "Hiper-respondedores de massa magra" (Lean Mass Hyper-Responders LMHR) foram publicados


Por muitos anos, a hipótese de que níveis elevados de LDL-C e ApoB são determinantes diretos da aterosclerose foi tratada quase como um dogma na cardiologia. Entretanto, o mais recente estudo prospectivo sobre os chamados lean mass hyper-responders — indivíduos magros, metabolicamente saudáveis e com colesterol total elevadíssimo induzido por dietas cetogênicas — chega para questionar essa ideia com dados inéditos e provocativos.

Este grupo, raramente estudado em profundidade, apresenta uma resposta metabólica incomum à restrição de carboidratos: elevações dramáticas nos níveis de LDL-C, frequentemente acima de 250 mg/dL, mas sem outras características de risco metabólico como resistência à insulina, triglicerídeos elevados ou obesidade. Assim, eles se tornaram o centro de um verdadeiro experimento natural, levantando uma pergunta central: o colesterol elevado em indivíduos saudáveis e magros realmente causa acúmulo de placa nas artérias?


O Estudo

Com uma média de IMC de 22,5 kg/m² e valores de LDL-C acima de 250 mg/dL, 100 participantes foram acompanhados por um ano com tomografia computadorizada coronariana de alta resolução. O objetivo era observar o acúmulo de placas de ateroma nas artérias coronárias ao longo do tempo.

O resultado? A maioria dos participantes não apresentou progressão significativa da doença arterial coronariana. Em alguns casos, houve até redução do volume total de placa. A mediana de alteração no volume percentual de ateroma (PAV) foi de apenas 0,8% — algo esperado apenas pelo envelhecimento natural e comparável a outras populações sem hipercolesterolemia.


O que explica a progressão da placa?

Ao contrário do esperado, nem o LDL-C nem o ApoB se mostraram preditores da progressão de placas. O único fator associado a essa progressão foi o escore de cálcio coronariano (CAC) basal. Ou seja, indivíduos que já apresentavam algum grau de calcificação no início do estudo eram os mais propensos a apresentar avanço nas placas — independentemente dos níveis de LDL ou ApoB.

Essa constatação abala a ideia simplista de que o LDL, por si só, é o vilão central na formação da aterosclerose, ao menos dentro desse fenótipo específico de indivíduos.


Por que isso importa?

É importante destacar que os LMHR representam uma população altamente diferenciada:

  • Os níveis elevados de colesterol não são congênitos, mas sim induzidos por dieta — ou seja, são uma resposta adaptativa à restrição de carboidratos.
  • Esses indivíduos são magros, com IMC abaixo de 25, e metabolicamente saudáveis.
  • O perfil lipídico inclui, além do LDL alto, HDL elevado e triglicerídeos baixos — um padrão geralmente associado a menor risco cardiovascular.


Essa combinação gera uma assinatura metabólica distinta, que merece ser interpretada fora das lentes tradicionais. Os dados sugerem que o risco absoluto associado ao LDL elevado é dependente do contexto, especialmente do estado metabólico e da origem da dislipidemia. Não se pode aplicar as mesmas interpretações usadas para indivíduos com resistência à insulina ou distúrbios genéticos lipídicos.


Conclusões e implicações

Este estudo desafia a noção de que altos níveis de LDL-C e ApoB são universalmente aterogênicos. Ele mostra que, em certos contextos — como o dos LMHR —, esses marcadores podem não se comportar da forma tradicionalmente esperada. Isso não significa que o LDL-C deva ser ignorado, mas sim que a interpretação de risco precisa ser mais refinada e baseada no contexto fisiológico do indivíduo.

Além disso, a ausência de progressão significativa das placas em um grupo com níveis tão elevados de colesterol levanta questões importantes sobre como se definem e tratam riscos cardiovasculares na prática clínica. O estudo sugere que talvez estejamos diante de uma subpopulação onde o paradigma precisa ser reavaliado.

Claro, mais estudos são necessários para confirmar essas observações a longo prazo. Mas uma coisa é certa: esse estudo abre espaço para uma discussão mais cuidadosa e menos dogmática sobre o papel do colesterol em populações metabolicamente saudáveis.

Fonte: https://www.jacc.org/doi/10.1016/j.jacadv.2025.101686

Nenhum comentário:

Tecnologia do Blogger.