Durante décadas, as batatas fritas de fast-food foram um símbolo de indulgência e sabor inconfundível, um ícone cultural com raízes profundas na culinária americana. Mas o que poucos lembram é que, até os anos 1990, esse sabor característico tinha uma origem bem específica: o sebo bovino. Hoje, numa curiosa volta ao passado, alguns restaurantes nos Estados Unidos estão redescobrindo esse ingrediente tradicional — e provocando reações inesperadas nos consumidores.
O jornal The Washington Post publicou recentemente um experimento curioso: repórteres e editores participaram de uma degustação às cegas com batatas fritas preparadas em três tipos diferentes de gordura — óleo de canola, banha de porco e sebo bovino. A ideia era simples: descobrir qual versão oferecia o melhor sabor, textura e aroma, sem que os participantes soubessem qual era qual.
O resultado surpreendeu até os mais céticos. A maioria identificou como superior exatamente a batata frita feita com sebo bovino. Segundo os avaliadores, ela apresentava um sabor mais profundo, “caramelizado” e com uma crocância mais persistente. Embora a banha de porco tenha sido considerada também saborosa, muitos a classificaram como mais pesada e com um retrogosto mais marcante. Já o óleo de canola, hoje amplamente utilizado por motivos de custo e estabilidade industrial, foi descrito como o menos interessante, com batatas menos crocantes e sabor neutro.
Essa volta ao uso do sebo bovino não é apenas uma questão de nostalgia ou paladar. Há um movimento crescente de chefs e consumidores que buscam formas de preparo mais tradicionais, com ingredientes minimamente processados. Nesse contexto, o sebo ganha relevância: é uma gordura saturada estável em altas temperaturas, rica em ácido esteárico — um tipo de gordura que não eleva os níveis de lipídios no sangue como muitos imaginam — e não contém os aditivos presentes nos óleos vegetais refinados, como antioxidantes sintéticos ou emulsificantes.
Outro aspecto levantado pela reportagem é a conexão emocional com o sabor. Muitos dos participantes do teste, ao descobrirem que o sabor preferido vinha do sebo bovino, relataram lembranças da infância, da comida servida em redes de fast-food nos anos 80. Essa experiência sensorial resgata uma percepção de autenticidade que, para muitos, foi perdida nas últimas décadas com a substituição por óleos vegetais “neutros”.
Ainda assim, o uso de gorduras animais enfrenta resistências. A narrativa construída ao longo de anos, associando as gorduras saturadas ao risco cardiovascular, persiste no imaginário coletivo, mesmo diante de estudos recentes que revisitam essas associações com mais nuance. A reintrodução do sebo na cozinha comercial, portanto, desafia não apenas preferências culinárias, mas paradigmas nutricionais que ainda influenciam políticas alimentares e escolhas pessoais.
Para além da degustação, o artigo do Washington Post convida à reflexão: será que a busca por alimentos mais saudáveis passou a ignorar o sabor? E será que, ao rejeitar certas práticas tradicionais por causa de crenças científicas desatualizadas, a sociedade acabou trocando o sabor autêntico por uma falsa promessa de saúde?
A experiência relatada mostra que o sebo bovino pode, sim, ter seu lugar legítimo à mesa — não como uma curiosidade exótica, mas como uma opção saborosa, estável e talvez até mais próxima do que muitos consideram “comida de verdade”.
Fonte: https://www.washingtonpost.com/food/2025/04/09/beef-tallow-french-fries-taste-test/