Dois contra o gelo: a dieta carnívora que salvou uma expedição no Ártico (1909)


Durante o início do século XX, em uma das regiões mais inóspitas do planeta, um homem provou que a determinação humana pode se sustentar com base em instintos primitivos — inclusive na alimentação. Ejnar Mikkelsen, explorador polar dinamarquês nascido em 1880, ficou conhecido por sua expedição quase suicida à Groenlândia, onde sobreviveu por mais de dois anos em condições extremas, alimentando-se basicamente de carne crua e gordura de animais polares.


Mikkelsen era um experiente navegador do Ártico e, em 1909, liderou a expedição Alabama com o objetivo de recuperar os registros de uma missão anterior liderada por Ludvig Mylius-Erichsen, desaparecida na Groenlândia. Após um encalhe do navio, ele e o engenheiro Iver Iversen decidiram atravessar o gelo à procura dos diários e mapas. Eles encontraram os documentos, mas o retorno foi um verdadeiro inferno gelado: enfrentaram tempestades, a ameaça constante de morte por congelamento, e uma escassez dramática de alimentos.


Ao retornar ao local onde haviam deixado o navio, descobriram que a tripulação os considerava mortos e havia ido embora. O Alabama já não existia. Eles estavam sozinhos em uma cabana improvisada no extremo nordeste da Groenlândia. E o inverno ártico se aproximava.

A dieta da sobrevivência

Durante os longos meses de confinamento e frio intenso, Mikkelsen e Iversen não tinham acesso a suprimentos convencionais. A dieta que os manteve vivos consistia essencialmente de carne de urso polar, gordura de foca e, em momentos de extrema necessidade, carne crua e congelada de animais caçados.


Essa alimentação, embora pareça extrema aos olhos modernos, seguia um padrão ancestral observado em várias populações nativas do Ártico, como os inuítes, que tradicionalmente se alimentavam quase exclusivamente de produtos de origem animal. A carne era frequentemente consumida crua ou levemente fermentada, o que preservava nutrientes essenciais que se perdem no cozimento. Além disso, o alto teor de gordura fornecia a energia necessária para suportar o frio extremo.

O próprio Mikkelsen escreveu em seu diário sobre a aversão inicial à gordura de urso e à carne crua, mas relatou que o corpo passou a aceitar — e até desejar — esses alimentos com o tempo. Com o passar dos meses, ele observou que essa alimentação permitia manter o peso, a força e a lucidez mental mesmo em temperaturas abaixo de -40°C e sem acesso a vegetais ou carboidratos.


Lições de uma dieta ancestral


A história de Ejnar Mikkelsen é frequentemente lembrada como um exemplo de coragem e perseverança. Mas ela também oferece um testemunho fascinante sobre as possibilidades da nutrição baseada em alimentos de origem animal. Sua experiência serve como um estudo de caso involuntário sobre a viabilidade da dieta carnívora — hoje debatida tanto em círculos científicos quanto no público em geral.

Ao contrário do que muitos pensam, a ausência de vegetais ou frutas não levou Mikkelsen ao escorbuto, uma deficiência grave de vitamina C. Isso porque, como estudos posteriores mostraram, a carne crua — especialmente órgãos como fígado e rins — contém pequenas quantidades de vitamina C suficientes para prevenir a doença. Além disso, o baixo consumo de carboidratos pode reduzir a necessidade dessa vitamina no organismo.


O retorno e o legado


Após dois invernos na solidão gelada da Groenlândia, Mikkelsen e Iversen foram finalmente resgatados em 1912. O explorador retornou à Dinamarca como herói, trazendo consigo não apenas os registros da expedição perdida, mas também um testemunho poderoso sobre resistência humana — física, psicológica e nutricional.


Anos depois, Mikkelsen escreveria sobre sua experiência no livro Two Against the Ice, que inspirou adaptações e renovou o interesse pela sua façanha, inclusive por sua dieta singular.

Em uma era em que a ciência nutricional redescobre o valor de dietas ancestrais, o exemplo de Mikkelsen lança luz sobre a capacidade humana de prosperar com alimentos naturais, densos em nutrientes e perfeitamente adequados às exigências extremas da natureza.

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