Dieta vegetariana na gravidez e infância: posição das sociedades pediátricas italianas
A crescente popularidade das dietas vegetarianas e veganas em todo o mundo, inclusive na infância e gravidez, levantou preocupações legítimas entre especialistas em saúde infantil. Este documento de consenso, publicado pela Sociedade Italiana de Pediatria Preventiva e Social (SIPPS), pela Federação Italiana de Médicos Pediatras (FIMP) e pela Sociedade Italiana de Medicina Perinatal (SIMP), revisa criticamente a adequação nutricional desses padrões alimentares nas fases mais vulneráveis do desenvolvimento humano.
Revisão das evidências disponíveis
As principais sociedades científicas internacionais — como a Academy of Nutrition and Dietetics dos EUA e o National Health and Medical Research Council da Austrália — consideram que dietas vegetarianas e veganas podem ser adequadas em todas as fases da vida, desde que bem planejadas e com suplementação adequada. No entanto, o painel italiano alerta que, na prática clínica, muitos adeptos dessas dietas — inclusive famílias com crianças — não seguem orientações nutricionais especializadas, o que aumenta o risco de deficiências nutricionais significativas.
O documento analisa evidências sobre vários aspectos: crescimento físico, desenvolvimento neurocognitivo, morbidade por doenças transmissíveis e não transmissíveis, risco de distúrbios alimentares e segurança da gestação em mulheres vegetarianas. A conclusão geral é clara: embora não seja possível afirmar que dietas vegetarianas causam crescimento inadequado, também não há evidência forte que comprove sua segurança sem suplementações específicas.
Nutrientes críticos nas dietas vegetarianas e veganas
As deficiências mais comuns identificadas em dietas vegetarianas — especialmente nas versões mais restritivas, como a vegana — envolvem:
- Vitamina B12
- Ferro
- Zinco
- Cálcio
- DHA (ácido docosa-hexaenoico)
- Vitamina D
- Iodo
Esses nutrientes são essenciais para o crescimento, desenvolvimento do sistema nervoso central e funcionamento do sistema imunológico. A carência de vitamina B12, em particular, foi associada a casos de atraso no desenvolvimento neurológico irreversível em crianças pequenas, especialmente lactentes amamentados por mães veganas não suplementadas.
Riscos na gravidez e amamentação
Durante a gravidez, o risco de deficiências nutricionais se acentua, podendo afetar o feto. Apesar da maior ingestão de folato e magnésio observada em mulheres vegetarianas, muitas delas apresentaram baixos níveis de ferro, zinco, vitamina B12 e DHA. Um estudo observacional apontou maior risco de hipospádia (malformação genital) em filhos de mães vegetarianas.
A recomendação dos autores é que mulheres grávidas ou lactantes que sigam dietas vegetarianas sejam monitoradas de perto e orientadas por profissionais capacitados, com suplementação garantida desses nutrientes críticos.
Crescimento e desenvolvimento infantil
A literatura analisada mostra que a maioria dos estudos que relatam crescimento normal em crianças vegetarianas consideram dietas com suplementações adequadas. Em estudos sem suplementação, os dados indicam crescimento e índices nutricionais abaixo da média. A evidência mais forte é a de que o risco de deficiências aumenta proporcionalmente ao grau de restrição alimentar. Portanto, dietas veganas e macrobioticas, sem acompanhamento profissional, não são consideradas adequadas para crianças.
Não foram encontrados estudos robustos que indicassem em que idade uma dieta vegetariana poderia ser iniciada sem riscos ao crescimento, tampouco existe consenso sobre a segurança da introdução alimentar totalmente baseada em vegetais em bebês.
Efeitos sobre doenças crônicas
Nos adultos, dietas vegetarianas estão associadas a menor risco de obesidade e algumas doenças cardiovasculares, mas os autores destacam que esses efeitos não podem ser extrapolados automaticamente para crianças. A associação observada em adultos pode refletir estilos de vida mais saudáveis (menos sedentarismo, menos tabagismo, maior nível socioeconômico), e não apenas a ausência de carne na alimentação.
Em crianças, não há evidência de que dietas vegetarianas prevenham doenças crônicas não transmissíveis, como câncer e diabetes tipo 2. Portanto, essas dietas não devem ser recomendadas com esse objetivo na infância.
Desenvolvimento neurocognitivo
A evidência científica é clara quanto ao papel de ferro, zinco e vitamina B12 no desenvolvimento neurológico. A deficiência prolongada desses nutrientes, sobretudo nos primeiros mil dias de vida, pode levar a prejuízos cognitivos duradouros. Por isso, os autores consideram que dietas vegetarianas não suplementadas são inaceitáveis do ponto de vista do desenvolvimento neuropsicomotor infantil.
Risco de distúrbios alimentares
Estudos apontam uma associação entre dietas vegetarianas e maior prevalência de distúrbios alimentares (como anorexia nervosa) em adolescentes, embora a relação causal ainda não seja conclusiva. O painel recomenda atenção redobrada por parte dos profissionais de saúde quanto a sinais precursores de transtornos alimentares em jovens vegetarianos.
Conclusão
A posição das três sociedades científicas italianas é clara: dietas vegetarianas, sobretudo as veganas, não são recomendadas durante a gravidez, amamentação e infância, salvo se cuidadosamente planejadas e suplementadas. O modelo alimentar considerado ideal para todas as fases da vida continua sendo a dieta mediterrânea, por sua riqueza em vegetais e uso moderado de alimentos de origem animal, sem necessidade de suplementações externas.
Para famílias que optam por um modelo vegetariano por razões éticas, ambientais ou de saúde, é fundamental o acompanhamento de um profissional qualificado. A desinformação ou negligência pode colocar em risco o crescimento, a cognição e a saúde geral das crianças.
Fonte: https://www.researchgate.net/publication/320004250_POSITION_PAPER_SIPPS-FIMP-SIMP_DIETE_VEGETARIANE_IN_GRAVIDANZA_ED_ETA_EVOLUTIVA
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