Deficiência de vitamina D em gestantes com dieta pobre em alimentos de origem animal: um alerta silencioso
Embora as recomendações nutricionais para gestantes frequentemente enfatizem a importância do ferro, ácido fólico e cálcio, um nutriente essencial tem recebido atenção crescente por seu impacto silencioso na saúde materna e fetal: a vitamina D. Um estudo recente publicado no International Journal of Medical Informatics chama atenção para as consequências adversas de um padrão alimentar com baixo consumo de alimentos de origem animal — mesmo quando há ingestão satisfatória de ferro.
Quando o padrão "saudável" esconde um risco
A pesquisa analisou dados de 1.423 gestantes taiwanesas, divididas em dois grupos alimentares principais:
- LP+LA: padrão com baixa ingestão de vegetais e de alimentos de origem animal
- MP+LA: padrão com ingestão moderada de vegetais e ainda baixa em alimentos de origem animal
Apesar de o grupo MP+LA ter apresentado níveis melhores de ferro e ferritina no sangue, ele também exibiu um dado preocupante: aumentada prevalência de insuficiência ou deficiência de vitamina D.
Mais de 74% das gestantes do grupo MP+LA apresentaram níveis inadequados de vitamina D — com 1,6% em estado de deficiência grave. A chance de ter vitamina D insuficiente foi 47% maior nesse grupo, mesmo após ajustes por idade, trimestre gestacional e ingestão calórica.
O problema vai além da ingestão alimentar
A vitamina D é uma substância lipossolúvel cuja principal fonte dietética é de origem animal. Peixes gordurosos, fígado, ovos e produtos fortificados são os principais alimentos que contribuem para manter níveis adequados. Em populações com consumo reduzido desses itens, como no padrão MP+LA, há maior risco de deficiência, especialmente em contextos com baixa exposição solar — como o observado entre parte das gestantes do estudo.
A suplementação, embora necessária em muitos casos, também mostrou-se limitada. Pesquisas citadas no próprio estudo indicam que doses entre 1.000 e 4.000 UI/dia de vitamina D durante a gestação não foram suficientes para aumentar significativamente as reservas de ferro ou prevenir sua queda, mesmo quando os níveis de vitamina D sérica subiram.
Essa observação reforça que a vitamina D não é simplesmente um coadjuvante no metabolismo do ferro. Há uma interação complexa entre esses nutrientes, e corrigir a deficiência de um não resolve automaticamente o outro. A deficiência de vitamina D durante a gestação está associada a complicações como pré-eclâmpsia, diabetes gestacional, parto prematuro e desenvolvimento esquelético prejudicado no feto.
Dietas pobres em alimentos animais: cuidado redobrado
Em tempos de maior adesão a padrões alimentares baseados em vegetais, especialmente entre mulheres jovens, é importante destacar que um consumo reduzido de carnes, ovos e peixes, sem compensação adequada com alimentos fortificados ou suplementação dirigida, pode resultar em deficiência de vitamina D. Mesmo com maior ingestão calórica e de outros nutrientes — como folato e ferro — a vitamina D permanece vulnerável.
O padrão alimentar MP+LA estudado é um retrato comum entre gestantes que acreditam estar se alimentando bem, mas que, por evitarem produtos de origem animal, comprometem a ingestão de nutrientes-chave. Esse grupo também não mostrou maior adesão a suplementos vitamínicos, o que agrava o problema.
O alerta da tecnologia
Utilizando algoritmos de aprendizado de máquina, os pesquisadores conseguiram prever com até 76% de acurácia quais gestantes estariam mais propensas a apresentar deficiência de vitamina D com base em seus padrões alimentares e biomarcadores. As variáveis mais influentes foram os níveis de ferro e ferritina, reforçando a relação inversa observada entre ferro elevado e vitamina D baixa no grupo MP+LA.
Esses achados mostram que o excesso relativo de ferro, em um contexto de baixa ingestão de vitamina D, pode não ser necessariamente benéfico, já que há indícios de competição metabólica entre os dois nutrientes. Em outras palavras, corrigir um desequilíbrio pode potencializar outro.
Conclusão
A mensagem mais importante deste estudo não está na eficácia das dietas com mais vegetais, mas sim em seus limites nutricionais ocultos. A deficiência de vitamina D pode passar despercebida mesmo quando outros indicadores bioquímicos estão adequados. Para gestantes que seguem padrões alimentares com baixa ingestão de produtos de origem animal, é fundamental realizar avaliações laboratoriais regulares e considerar a suplementação de vitamina D de forma individualizada.
A saúde materna exige equilíbrio — e esse equilíbrio nem sempre está visível na superfície da alimentação. A vitamina D, muitas vezes negligenciada, precisa voltar ao centro da atenção em protocolos nutricionais voltados à gestação.
Fonte: https://doi.org/10.1016/j.ijmedinf.2025.105890
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