Crítica às Recomendações da ADA para Aumento do Consumo de Carboidratos em Diabéticos (1971)


A recomendação da Associação Americana de Diabetes (ADA) em 2 de outubro de 1971, sugerindo que diabéticos consumam a mesma quantidade de carboidratos que a população geral, representou uma mudança drástica na abordagem do tratamento da doença. No entanto, essa diretriz entra em conflito com evidências médicas anteriores que enfatizavam a restrição de carboidratos para o controle glicêmico. A adoção dessa recomendação sem considerar os dados históricos e clínicos já disponíveis pode ter contribuído para o aumento das complicações metabólicas observadas nas décadas seguintes.

1. Evidências Contrárias Anteriores a 1971

A recomendação da ADA de elevar o consumo de carboidratos a 45% da dieta diária ignorou abordagens terapêuticas bem estabelecidas desde o século XIX, que demonstravam os benefícios da restrição de carboidratos no controle da glicemia em diabéticos.

  • John Rollo (1797): Um dos primeiros médicos a documentar o tratamento do diabetes com uma dieta restrita em carboidratos. Rollo tratou oficiais militares diabéticos com uma alimentação baseada principalmente em proteínas e gorduras, reduzindo os sintomas da doença.  
  • Frederick Allen (1910-1920): Desenvolveu um regime de controle rigoroso para diabéticos antes da descoberta da insulina, utilizando dietas extremamente baixas em carboidratos. Sua abordagem ajudava a prolongar a vida dos pacientes, retardando o avanço da doença.  
  • Elliott Joslin (1920-1930): Um dos principais especialistas em diabetes do século XX, Joslin defendia a restrição de carboidratos e o controle rigoroso do peso corporal como estratégias eficazes para o manejo da doença.  


Durante décadas, essas abordagens focaram na redução do consumo de carboidratos, pois já era bem compreendido que os carboidratos elevam diretamente os níveis de açúcar no sangue, o que pode ser prejudicial para diabéticos.

2. O Problema do Controle Glicêmico

O diabetes é uma condição em que o corpo tem dificuldade em regular a glicose sanguínea, e os carboidratos são o principal nutriente que afeta esse mecanismo. A recomendação da ADA de 1971 incentivou um aumento no consumo de carboidratos sem considerar que: 

  • Carboidratos elevam diretamente os níveis de glicose no sangue, exigindo uma resposta eficiente da insulina. Para muitos diabéticos, especialmente aqueles que produzem pouca ou nenhuma insulina, um alto consumo de carboidratos pode agravar a hiperglicemia.  
  • Dietas de baixo carboidrato já eram reconhecidas como eficazes no controle do diabetes. Evidências prévias a 1971 já mostravam que limitar carboidratos ajudava a estabilizar os níveis de açúcar no sangue sem a necessidade de medicamentos adicionais.  
  • A necessidade de insulina e medicamentos aumentaria. Ao incentivar um maior consumo de carboidratos, a ADA essencialmente tornou os diabéticos mais dependentes de insulina e medicamentos para controlar sua glicemia.  


3. O Paradoxo da Restrição Calórica

A ADA argumentou em 1971 que a restrição calórica era o fator mais importante no tratamento do diabetes, independentemente da proporção de macronutrientes. No entanto, essa abordagem desconsidera um fator crucial:

  • Dietas ricas em carboidratos dificultam o controle do apetite. Alimentos ricos em carboidratos tendem a aumentar os níveis de insulina, o que pode levar a picos de fome e dificuldades na manutenção da perda de peso.  
  • Se a maioria dos diabéticos é obesa, como a ADA reconheceu em 1971, faz sentido recomendar mais carboidratos? Dietas com maior teor de proteínas e gorduras saudáveis poderiam ser mais eficazes para promover a saciedade e evitar o ganho de peso.  


4. O Papel das Gorduras na Saúde Metabólica

A recomendação da ADA também reforçou a ideia de que os diabéticos deveriam reduzir a ingestão de gorduras. Na época, acreditava-se que isso ajudaria a prevenir complicações cardiovasculares. No entanto, essa visão já vinha sendo questionada antes de 1971:

  • Em 1957, estudos indicavam que dietas ricas em gorduras não aumentavam o risco de doenças cardíacas em diabéticos.  
  • Durante as décadas de 1940 e 1950, médicos que testaram dietas com baixo teor de carboidratos e maior consumo de gorduras observaram melhor controle glicêmico em diabéticos.  


Décadas depois, nos anos 2000 e 2010, estudos modernos confirmariam que dietas ricas em gorduras saudáveis – como azeite de oliva, abacate e nozes – podem melhorar os marcadores metabólicos e reduzir a resistência à insulina.

5. Omissão de Evidências Científicas

A ADA justificou sua mudança de recomendação em 1971 citando estudos que indicavam que dietas ricas em carboidratos podiam reduzir os níveis de açúcar no sangue em diabéticos leves e indivíduos saudáveis. No entanto, esses achados foram aplicados de forma generalizada, sem considerar:

  • A gravidade do diabetes em diferentes indivíduos. O impacto do consumo de carboidratos pode variar amplamente entre um diabético leve e um paciente com resistência severa à insulina.  
  • Estudos anteriores que mostravam que a restrição de carboidratos reduzia a necessidade de insulina e melhorava o controle da doença.  
  • O impacto da recomendação na prática clínica. A mudança para dietas com mais carboidratos fez com que muitos médicos passassem a prescrever insulina e medicamentos em maior escala, tornando os pacientes mais dependentes desses tratamentos.  


Em 1971, quando a ADA fez essa recomendação, evidências já mostravam que dietas ricas em carboidratos poderiam ser problemáticas para diabéticos. No entanto, ao invés de basear sua diretriz nas décadas de pesquisa prévias, a associação optou por alinhar sua recomendação às tendências alimentares da época, que promoviam o aumento do consumo de carboidratos para toda a população.

Conclusão: Uma Recomendação Questionável

A decisão da ADA de aumentar a recomendação de carboidratos em 1971 contradisse décadas de evidências médicas que enfatizavam a restrição desse macronutriente para o controle do diabetes. Essa recomendação pode ter sido influenciada por diretrizes nutricionais gerais da época, que estavam começando a demonizar as gorduras na dieta.

Embora algumas pessoas possam ter se beneficiado dessa abordagem, muitas outras podem ter experimentado um pior controle glicêmico, aumento da necessidade de insulina e maior risco de complicações metabólicas.

Diante disso, médicos e pacientes deveriam ter analisado essas diretrizes com mais cautela e considerado abordagens alternativas, como dietas mais baixas em carboidratos, que já vinham sendo utilizadas com sucesso desde o século XIX. A história do tratamento do diabetes mostra que, muitas vezes, recomendações baseadas em tendências nutricionais podem não ser a melhor opção para todos os pacientes.

Fonte: https://nyti.ms/4ikSgEb

Nenhum comentário:

Tecnologia do Blogger.