As sirtuínas não são genes de longevidade conservados


Durante décadas, a ciência buscou desvendar os segredos do envelhecimento, alimentando esperanças de que um único gene ou via metabólica poderia deter — ou ao menos desacelerar — o tempo. Uma das linhas de pesquisa mais celebradas envolveu os genes da família SIR2, especialmente suas versões em mamíferos, conhecidas como sirtuínas. Com a promessa de que poderiam imitar os efeitos benéficos da restrição calórica, estender a vida e prevenir doenças relacionadas à idade, as sirtuínas se tornaram estrelas da biologia do envelhecimento. No entanto, como mostra o artigo de Charles Brenner publicado na Life Metabolism, essa promessa nunca se concretizou de forma sólida e replicável.

O estudo parte de um princípio fundamental da biologia: para que um gene seja considerado conservado, ele precisa desempenhar a mesma função essencial em diferentes organismos e estar sob pressão seletiva ao longo da evolução. Embora as sirtuínas compartilhem uma atividade bioquímica altamente conservada — a remoção de grupos acila de resíduos de lisina dependente de NAD+ —, suas funções biológicas relacionadas à longevidade não são preservadas entre espécies.

O caso emblemático do gene SIR2 em leveduras (Saccharomyces cerevisiae) foi um dos principais motores da ideia de que sirtuínas estenderiam a vida. SIR2 demonstrou aumentar a longevidade replicativa de células-mãe em um modelo laboratorial. Mas essa longevidade favorece uma célula rara — uma entre cinco milhões — e não oferece vantagem evolutiva real. Ainda mais revelador: em outro modelo de envelhecimento, o cronológico, a presença do gene SIR2 encurta a vida das células. Ou seja, o próprio modelo experimental em leveduras apresenta contradições que colocam em dúvida a ideia de que SIR2 seja um gene de longevidade.

Mesmo assim, a teoria migrou para organismos mais complexos. Experimentos iniciais com vermes e moscas indicaram que a superexpressão de sirtuínas aumentaria a longevidade. Porém, essas descobertas não resistiram à replicação. Estudos mais rigorosos demonstraram que os efeitos benéficos observados eram, na verdade, artefatos causados por mutações não intencionais ou por falhas metodológicas. Além disso, deletar uma cópia do gene dSir2 em moscas aumentava a longevidade, principalmente em dietas pobres em aminoácidos — o oposto do que se esperava.

O entusiasmo com as sirtuínas levou ao surgimento de empresas, investimentos milionários e um verdadeiro fenômeno cultural, com livros e podcasts promovendo compostos como o resveratrol — supostamente ativador das sirtuínas — como fontes da juventude. Contudo, estudos posteriores revelaram que o resveratrol não ativa diretamente as sirtuínas. Seus efeitos em modelos animais foram inconsistentes, frequentemente explicáveis por outros mecanismos, e sem tradução clara para humanos. Ainda mais comprometedor: os testes bioquímicos usados para identificar esses ativadores estavam baseados em artefatos causados por grupos fluorescentes usados nos ensaios.

Mesmo em mamíferos, os dados não corroboram a tese de que sirtuínas prolongam a vida. Múltiplas linhagens de camundongos transgênicos com superexpressão de SIRT1, a sirtuína humana mais estudada, não apresentaram aumento de longevidade. Em um caso específico, uma linhagem com superexpressão em regiões cerebrais específicas viveu 11% a mais, mas os resultados foram altamente dependentes do local de inserção do transgene e não replicados em outras linhagens.

Já SIRT6, outra sirtuína estudada, apresentou efeitos promissores em determinados contextos — especialmente em camundongos machos — mas esses resultados foram limitados por diferenças entre linhagens e sexos. Além disso, os mecanismos propostos, como a regulação da gliconeogênese, podem ser benéficos em camundongos idosos, mas não necessariamente em humanos, onde níveis elevados de glicose estão associados a pior prognóstico.

O autor ainda critica o uso leviano das sirtuínas como explicação para os benefícios da reposição de NAD+. Muitos estudos inferem, sem validação genética, que o aumento de NAD+ melhora a saúde por ativar sirtuínas. No entanto, o sistema do NAD+ está envolvido em processos muito mais amplos e críticos, como reparo de DNA, metabolismo energético, resposta imunológica e proteção contra estresse oxidativo — funções que não dependem exclusivamente das sirtuínas.

Por fim, Charles Brenner conclui que o entusiasmo em torno das sirtuínas como genes de longevidade conservados se baseou em uma combinação de viés de formulação, viés de confirmação e viés de publicação. O resultado foi uma narrativa científica amplamente divulgada, mas com fundamentos frágeis e inconsistentes. Embora as sirtuínas sejam enzimas importantes e interessantes, seu papel central no controle do envelhecimento animal e humano não se sustenta diante de uma análise rigorosa e imparcial dos dados disponíveis.

O estudo é um chamado à sobriedade científica: ideias sedutoras exigem evidências extraordinárias, especialmente quando envolvem promessas tão humanas quanto a de escapar do envelhecimento.

Fonte: https://doi.org/10.1093/lifemeta/loac025

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