Uma resposta estoica à beleza.


“Ver um mundo em um grão de areia/ e um paraíso numa flor selvagem/ Segure o infinito na palma da sua mão/ e a eternidade em uma hora.” — William Blake, 'Auguries of Innocence'

Os estoicos não são exatamente famosos por suas ideias sobre beleza e é fácil entender por quê. Sendo campeões da razão (todos saúdam), os estoicos parecem ter pouco interesse em uma disciplina tão subjetiva e emocionalmente carregada como a estética. Ao contrário da crença popular, no entanto, os estoicos tinham ideias bem formadas sobre a beleza, chegando mesmo a considerar tudo o que é bom como belo.

Embora a maior parte do material estoico sobre a beleza tenha se perdido na lata de lixo da história, muito dele pode ser inferido por meio de seus escritos sobre ética. Em vários textos de inspiração estoica, a linguagem estética é frequentemente empregada para fazer um ponto, especialmente no calor de uma discussão moral. Para kalon, por exemplo, frequentemente surge nos escritos de Aristóteles e Cícero, um termo grego que se traduz aproximadamente como belo, honrado e nobre. No entanto, a definição estoica mais explícita de beleza vem das obras fragmentárias de Crisipo, a terceira escola da Stoa, que a definiu como "uma soma de partes entre si e com um todo." Como Galeno, um médico de Marco Aurélio, registra:

“Crisipo ... deter a beleza não consiste nos elementos do corpo (em si), mas na proporção harmoniosa das partes. A proporção de um dedo para outro, de todos os dedos para o resto da mão, do resto da mão para o pulso, e destes para o antebraço, e do antebraço para o braço inteiro, e em suma, tudo para todo o resto." (De Placitis Hippocratis et Platonis, V.448)

É importante notar que esta definição de beleza como a proporção adequada e o funcionamento das partes se aplica tanto ao corpo humano quanto à alma, onde a alma, neste sentido do termo, é entendida como o locus da racionalidade. Embora a beleza física (também conhecida como indiferente preferida) seja desejável, para os estoicos, a verdadeira beleza está no interior. A beleza não é algo tão superficial quanto a aparência de uma pessoa, mas pode ser representada na vida cotidiana.

Como alguém irradia beleza por meio de seu caráter? De acordo com os estoicos, um caráter completo consiste em quatro virtudes cardeais, incluindo sabedoria, coragem, justiça e temperança. Embora essas virtudes não sejam necessariamente intrínsecas ao caráter de uma pessoa, elas podem ser desenvolvidas com o tempo por meio de uma longa cadeia de endireitamento.

Por exemplo, uma das maneiras pelas quais os estoicos procuraram cultivar a sabedoria era encontrar beleza na vida cotidiana. Quando crianças, nascemos com uma curiosidade natural sobre o mundo e nosso lugar nele. Infelizmente, à medida que amadurecemos e desenvolvemos uma rotina, nossa curiosidade natural sobre o mundo diminui junto com nosso intelecto. Ao buscar a beleza no pequeno e no mundano, os estoicos foram capazes de aprofundar seu conhecimento sobre o mundo, bem como lidar melhor com quaisquer obstáculos que a vida colocasse em seu caminho.

Isso não significa que os estoicos fossem necessariamente otimistas. Uma caracterização mais precisa seria realista. Uma das maneiras pelas quais os estoicos procuraram restaurar a objetividade de sua visão de mundo foi por meio de uma prática chamada de expressões de desprezo. Este exercício envolve reconhecer os aspectos do mundo pelo que eles são, e não pelo que percebemos que eles são, ou, como Marco Aurélio observou, "arrancar a lenda que os incrustou". Por exemplo, um bife suculento nada mais é que uma vaca morta, as fronteiras estaduais são invisíveis, as linhas arbitrárias e as bebidas alcoólicas são simplesmente etanol revestido de açúcar.

Por que os estoicos fariam isso? Porque, ao exagerar na glamourização do mundo material, aumentamos nosso risco de sermos consumidos por ele. E se há uma lição que a civilização ocidental pode se beneficiar com o estoicismo, é que a felicidade não se encontra no mundo material. Além disso, praticando expressões de desdém, os estoicos descobriram que podiam manter o ego sob controle enquanto tornavam os maus hábitos menos atraentes. Isso os ajudou a se libertar de vários vícios e deixar sua verdadeira beleza brilhar.

Outra maneira pela qual os estoicos procuraram desenvolver uma virtude como a temperança era limitar ou abster-se do consumo de álcool. Embora os estoicos considerassem uma variedade de prazeres indiferentes preferidos, eles possuíam prazeres que compensavam nossa capacidade de raciocinar com um certo nível de desprezo. Como afirma Epicteto:

“É uma marca de falta de intelecto gastar muito tempo em coisas relacionadas ao corpo, como ser desmedido em exercícios, em comer e beber, e no desempenho de outras funções animais. Essas coisas devem ser feitas incidentalmente e nossa principal força deve ser aplicada à nossa razão.”

A razão é o que insere significado moral em nossas ações. Ações que carecem de razões carecem de intenções e ações que carecem de intenções carecem de significado moral. Há uma distinção moral entre derrubar intencionalmente o vidro de alguém e não intencionalmente derrubar o vidro de alguém. Visto que beber prejudica a capacidade de raciocinar, não deveria ser surpresa que os estoicos desdenhassem ficar bêbados. A cada gole de álcool ganho, nosso caráter moral se perde.

Portanto, acredite nos estoicos: a beleza não está nos olhos de quem vê, nem é uma qualidade que sobrevive misteriosamente em certos objetos ou pessoas. Em vez disso, é o resultado final de uma pessoa exalando as quatro virtudes cardeais por meio de um processo de tentativa e erro. Assim, o bom e o belo, longe de serem polos opostos, são duas facetas de uma mesma vida bem vivida.

Fonte: https://bit.ly/326bs3B

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