Novembro cinza: O rastreamento do câncer de próstata na berlinda
É mais reconfortante para um paciente operado de câncer de próstata crer que sua vida foi salva pela medicina do que pensar que sua impotência sexual se deve a um exame desnecessário.
por Olavo Amaral,
São onze da manhã de uma terça-feira de novembro de 2016, e André Di Paulo se prepara para entrar em cena. Do lado de fora da academia Bio Ritmo, no terraço do Conjunto Nacional, em São Paulo, ele tira de um saco plástico um bigode preto gigante, de mais de 2 metros de envergadura. Veste o adereço, que esconde seu rosto e os braços e deixa à mostra apenas as pernas, pequenas e frágeis se comparadas às dimensões da fantasia.
O ator ingressa no café da academia, e em segundos um homem com pinta de gerente aparece e chama a equipe de funcionários para uma foto. A duras penas, dada a incompatibilidade do traje com a largura das passagens, Bigode visita as salas da academia, cujos aparelhos estão na maior parte ociosos nessa hora ingrata para as classes trabalhadoras. À sua frente, Itaciara Monteiro, funcionária do Instituto Lado a Lado pela Vida, distribui panfletos para mulheres que fazem abdominais e semeia palavras sobre "prevenção da saúde do homem". Na sala de musculação, as funcionárias vibram ao deparar com um bigodudo de verdade, que se vê impelido a posar ao lado do irmão maior.
Por fim, Bigode sobe numa esteira de corrida e finge se exercitar com os equipamentos – apenas para as pernas, já que o vestuário lhe imobiliza os braços. Enquanto isso, Monteiro registra tudo com fotos que em algumas horas estarão no Facebook da campanha Novembro Azul.
De cara limpa – me barbeei na semana anterior, de forma a manter minha neutralidade capilar em relação à campanha, que usa o bigode como forma de chamar a atenção para o câncer de próstata –, observo a cena com curiosidade, encostado numa bicicleta ergométrica.
Terminada a intervenção, a equipe volta ao hall do Conjunto Nacional, localizado entre a avenida Paulista e a rua Augusta. No térreo, cartazes com rostos bonitos e famílias felizes informam que "o câncer de próstata é uma doença silenciosa, que não apresenta sintomas na fase inicial", e que "o exame e o diagnóstico precoce aumentam em 90% as chances de cura". Ao lado deles, uma moça entrega folhetos. Aos homens que se detêm, a mensagem é explícita: "Acima de 45 ou 50 anos precisa fazer exame, tá?" Nos folhetos, a informação também é direta: "Na ausência de sintomas, homens a partir dos 50 anos, ou dos 45, se houver histórico familiar ou raça negra, devem ir anualmente ao urologista para realizar o exame retal e fazer o exame de PSA no sangue."
Em meio ao vai e vem dos passantes, um repórter da tv Assembleia SP entrevista a jornalista Marlene Oliveira, presidente do Lado a Lado pela Vida. Alheia ao susto que Bigode provoca nos passantes ao dançar pelo hall como uma assombração, ela discorre sobre o trabalho do instituto, mencionando palestras em empresas e ações de rua, e comenta que "os homens se identificam com o mascote, isso os aproxima da campanha". Cercado de ameaçadores pelos faciais – ao meu lado, a vitrine da Livraria Cultura exibe um cartaz da HQ A Gigantesca Barba do Mal, de Stephen Collins –, eu me permito discordar.
Discordar do Novembro Azul, porém, não é trivial. Em 2015, o secretário da Saúde do Rio Grande do Sul, João Gabbardo dos Reis, disse em entrevista à rádio de maior audiência no estado que a secretaria, ao contrário da campanha, não recomendava exames de próstata para todos os homens a partir de certa idade. Sua argumentação, taxativa, era de que "os trabalhos científicos atualmente demonstram que não existe nenhuma vantagem de as pessoas fazerem exames dessa forma". Os dois entrevistadores mostraram-se perplexos. E, a despeito dos mais de dez minutos de explicações, no dia seguinte a mídia chiou, acusando Gabbardo de causar um desserviço à população.
O jornal Zero Hora, por exemplo, incluiu a declaração no quadro "É isso mesmo?", no qual se consultam especialistas sobre a veracidade de uma afirmação. Três urologistas diziam, de forma unânime, que o secretário estava equivocado. "Existem estudos bem-feitos, com populações grandes, principalmente da Europa, que mostram que políticas de rastreamento do câncer de próstata estão associadas a uma diminuição de até 20% nos óbitos pela doença no futuro, em quinze anos. Esperar um homem sentir algo para fazer os exames é tirar dele a chance de cura", declarou Lucas Nogueira, então coordenador do Departamento de Urooncologia da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU). O jornal concluía a reportagem com um carimbo de NÃO PROCEDE e o desenho de um polegar voltado para baixo.
Um ano depois, em 2016, a situação não parece tão diferente. No prédio da Assembleia Legislativa gaúcha, um outdoor gigantesco informa: "O exame é rápido. A tranquilidade é para toda a vida." No Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, uma enorme fita azul pende do alto do edifício ao chão. Gabbardo, porém, resiste em sua posição, fazendo jus a suas credenciais de médico e ultramaratonista. Ele me recebe preparando café em seu gabinete, numa tarde tranquila antes de um feriadão. "Foi um incômodo pessoal que me levou a me manifestar. Eu sabia o que estava acontecendo, que havia entidades com posições contrárias ao rastreamento. E eu estava sendo chamado para dar testemunho sobre uma coisa com que eu não concordava", diz ele.
A controvérsia pode ter sido uma novidade em 2015 na provinciana Porto Alegre, minha cidade natal. No entanto, ela refletia uma situação que já se repetira ao redor do mundo nas duas décadas precedentes. Em 2002, dois médicos questionaram a eficácia do rastreamento do câncer de próstata no San Francisco Chronicle e foram acusados de "geriatricidas". Em 2003, Alan Coates, então presidente do Conselho de Câncer da Austrália, foi xingado de "apóstata" e acusado de praticar "vandalismo de políticas públicas" ao declarar que optara por não fazer o exame de próstata. Gabbardo foi apenas mais uma voz a pagar o preço de defender uma causa impopular.
Descoberto no início dos anos 70, o antígeno prostático específico (para os íntimos, PSA, na sigla em inglês), produzido por células da próstata, é uma proteína cujo nível no sangue pode ser detectado por um simples exame de laboratório. O primeiro a nomeá-la "PSA" foi Richard Ablin, da Universidade do Arizona, que em 2014 publicaria o livro The Great Prostate Hoax: How Big Medicine Hijacked the PSA Test and Caused a Public Health Disaster [A Grande Farsa da Próstata: Como a Grande Medicina Sequestrou o Teste de PSA e Causou um Desastre de Saúde Pública]. Não se sabe em que medida a posição do autor pode ter sido influenciada pelo ressentimento: nos anos 80, a patente do exame para detectar o PSA foi obtida por pesquisadores rivais, que logo a venderam para a Hybritech, uma empresa capaz de fabricar os kits para realizá-lo.
O raciocínio por trás da recomendação do PSA para o diagnóstico do câncer é simples – por se tratar de uma proteína produzida em células da próstata em quantidade muito maior do que em outras células do corpo, elevações de seu nível sanguíneo costumam estar associadas a doenças do órgão: seja porque ele se avoluma, seja porque suas células morrem e liberam a proteína no sangue. Nem todas essas doenças são cânceres: o aumento benigno da próstata, que ocorre na maior parte dos homens maduros, a inflamação ou até a massagem da glândula podem causar resultados semelhantes. Ainda assim, o PSA se correlaciona com o risco da doença – quanto maior seu nível sanguíneo, maior a probabilidade de um tumor.
O caráter inespecífico do exame não constituía problema no uso para o qual ele foi aprovado em 1986, nos Estados Unidos: o acompanhamento de pacientes em terapia de câncer de próstata. Em homens que retiraram a glândula, os níveis da proteína no sangue tendem a se aproximar do zero; assim, qualquer aumento do PSA pode ser interpretado como sinal de recorrência da doença. Além disso, pacientes com tumores disseminados em geral apresentam níveis de PSA tão altos que é possível dizer com confiança que a proteína é produzida pelo tumor, fazendo do exame uma excelente ferramenta para monitorar a evolução da doença.
Tal indicação apresentava um potencial de mercado restrito – na época, em torno de 0,1% da população americana era diagnosticada com câncer de próstata a cada ano. A perspectiva de aplicação do teste, porém, mudou radicalmente quando, entre o final dos anos 80 e o início dos 90, constatou-se que o PSA era capaz de avaliar o risco de câncer de próstata em indivíduos assintomáticos. A ferramenta estava longe de ser perfeita: utilizando-se o valor de 4 ng/ml como ponto de corte, o exame era positivo em 20% dos pacientes com câncer de próstata, mas também em 6% dos indivíduos sem câncer. Com um valor de 2,5 ng/ml, o resultado era positivo em 40% dos cânceres de próstata e em 19% dos indivíduos normais. Com isso, era impossível estabelecer um ponto de corte que detectasse a maioria dos cânceres sem incorrer em biópsias desnecessárias.
Isso não diminuiu o entusiasmo dos pesquisadores diante da possibilidade de usar o PSA para o "rastreamento" do câncer de próstata – ou seja, para detectar a doença, a partir de certa idade, em homens assintomáticos. O raciocínio fazia sentido: o câncer de próstata é uma doença grave e comum, que em 1990 matava quase 40 mil homens por ano nos Estados Unidos; no Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima atualmente mais de 13 mil mortes anuais. Seria notável dispor de um exame, mesmo imperfeito, que fosse capaz de detectar tumores precocemente e diminuir as mortes. A medicina tinha precedentes históricos de sucesso: a queda marcante na mortalidade por câncer de colo de útero após a instituição do exame de Papanicolau, bem como reduções mais modestas na mortalidade do câncer de mama com a mamografia, e dos tumores de cólon com a pesquisa de sangue oculto nas fezes e a colonoscopia. Se um exame de sangue pudesse fazer o mesmo para a próstata, as consequências seriam revolucionárias.
Os primeiros estudos para a detecção do câncer de próstata surgiram numa época em que o PSA não estava licenciado para esse fim nos Estados Unidos. Isso não impediu que já em 1989 se realizasse naquele país a primeira semana de conscientização sobre a próstata, financiada pela poderosa farmacêutica Schering-Plough – que aprovara na época o EulexinR (flutamida) para o tratamento do câncer de próstata avançado. Com um polpudo investimento em publicidade, a campanha visava aumentar a percepção pública sobre a doença, contando com celebridades como o general Norman Schwarzkopf, herói da Primeira Guerra do Golfo. Diversos centros dos Estados Unidos ofereciam, grátis, por uma semana, o PSA e o toque retal. O evento foi repetido com um crescimento expressivo: em 1990, 150 mil homens se submeteram ao exame durante a semana; em 1996, já eram 700 mil.
Com uma blitz de divulgação e trabalhos sobre o tema sendo publicados um atrás do outro, o exame de PSA em homens assintomáticos tornou-se prática corriqueira nos Estados Unidos, mesmo que este tipo de uso ainda não tivesse sido aprovado pelo FDA (Food and Drug Administration, agência responsável por regulamentar testes diagnósticos e remédios no país). Como ele já estava no mercado, nada impedia que os médicos o indicassem para este fim. Tampouco importava que não houvesse qualquer monitoramento de longo prazo que demonstrasse sua eficácia em diminuir a mortalidade pela doença. A aprovação para o rastreamento seria solicitada em 1993 pela Hybritech, detentora da patente do teste e a essa altura já incorporada pela Eli Lilly, uma gigante da indústria farmacêutica, por algo em torno de 400 milhões de dólares. Depondo a favor dela estava William Catalona, urologista que havia se tornado o grande paladino da causa – coincidência ou não, com pesquisas financiadas pela Hybritech.
Apesar de críticas vigorosas de especialistas, o fda aprovou o teste para uso diagnóstico, abrindo a porteira para a rotinização do rastreamento. Já em 1992, a Sociedade Americana de Câncer recomendava o PSA anual a partir dos 50 anos, bem como o toque retal a partir dos 40. A indicação seria logo seguida pela Associação Americana de Urologia e pela maior parte das sociedades médicas dos Estados Unidos e do mundo. No Brasil não seria diferente, e o "exame de próstata" se instalaria rapidamente no imaginário popular como uma rotina a ser seguida – e também como assunto de piadas de boteco.
Para júbilo geral, a taxa de sobrevivência relativa em cinco anos do câncer de próstata (estatística que avalia a porcentagem de pessoas vivas com a doença após esse período, quando comparada a uma população da mesma idade sem a doença) saltou de 75% em 1985 para 99,7% em 2004, e as taxas de sobrevivência em quinze anos cresceram para além de 80%. O câncer de próstata era curável em mais de 90% dos casos quando detectado na forma localizada, mas não depois de se espalhar pelo corpo. A estratégia de detectá-lo o quanto antes parecia fazer todo sentido.
Foi então que, em 2009, o inesperado aconteceu.
Dentre os cânceres comuns, o de próstata é um dos que cresce mais devagar, e mesmo pacientes com tumores avançados podem viver mais de uma década com a doença. Assim, qualquer redução de mortalidade pelo diagnóstico precoce só poderia ser observada após muitos anos, e os estudos para avaliar o real benefício do rastreamento teriam que durar pelo menos uma década. Além disso, seria preciso recrutar um número ciclópico de pacientes – como apenas cerca de 3% das mortes na população masculina americana são causadas por câncer de próstata, validar uma redução na mortalidade pelo rastreamento requereria acompanhar dezenas de milhares de indivíduos.
Para complicar, não bastaria comparar a mortalidade por câncer de próstata antes e depois do início do uso do PSA. Apesar de ter sido observado um decréscimo entre 40 e 50% no número de mortes pela doença nos Estados Unidos desde a época em que o exame foi introduzido até os dias atuais, nada impede que isso tenha se dado pelo menos em parte por avanços no tratamento. Tampouco bastaria comparar indivíduos que realizam o PSA por vontade própria com aqueles que não o fazem, já que homens que procuram o "check-up da próstata" em geral cuidam mais da saúde. Como estabelecido há décadas, a questão teria de ser decidida por um "ensaio clínico randomizado": um tipo de estudo em que voluntários são recrutados e aleatoriamente divididos em dois grupos, dos quais apenas um recebe uma intervenção – no caso, o rastreamento do câncer de próstata.
Desde a década de 90, dois monumentais experimentos do tipo vinham sendo realizados.
O European Randomized Study of Screening for Prostate Cancer havia recrutado 182 160 sujeitos entre 50 e 75 anos, em sete países da Europa, aleatoriamente divididos num grupo que, ao longo de cerca de nove anos, se submeteria ao exame do PSA a cada quatro anos, e em outro que não seguiria a rotina. O Prostate, Lung, Colorectal and Ovarian Cancer Screening Trial amealhara 76 693 homens nos Estados Unidos, divididos entre um grupo que realizaria exames de PSA e toque retal anualmente por seis e quatro anos, respectivamente, e outro que não faria isso de forma sistemática. Esperava-se assim estabelecer definitivamente o benefício do teste, e foi com estardalhaço que, em março de 2009, os resultados surgiram lado a lado no New England Journal of Medicine, a publicação médica mais prestigiosa do mundo.
Foi um balde de água fria. No estudo americano, a mortalidade por câncer de próstata havia sido 13% maior no grupo designado para fazer os exames, embora esta diferença não atingisse significância estatística: ambos os grupos estavam em "empate técnico" quando consideradas as margens de erro. Já no ensaio clínico europeu, passados nove anos, observou-se uma redução de 20% na mortalidade por câncer de próstata no grupo submetido ao exame. Tal benefício era estatisticamente significativo, mas discreto, considerando-se o número de homens que passaram pelo rastreamento – e, mais importante, o número de homens tratados. O trabalho estimou que, para poupar uma única vida, seria necessário fazer exames em mais de mil homens, realizar cerca de 150 biópsias de próstata (um procedimento doloroso em que fragmentos da glândula são retirados com agulhas através do reto) e fazer 48 diagnósticos de câncer (a maior parte dos quais seria tratada através de cirurgia ou radioterapia).
O esforço para salvar vidas pode parecer válido, mas para cada homem salvo pelo exame, outros 47 haviam recebido um diagnóstico de câncer sem ter sua vida salva – fosse porque o diagnóstico precoce não levara à cura, fosse porque eles não morreriam da doença naquele período mesmo sem serem tratados. Dentre os homens diagnosticados com câncer no grupo que passou pelo rastreamento, 40% haviam sido tratados com a remoção da próstata e 31% com radioterapia, procedimentos com complicações significativas. A cirurgia para a retirada do câncer pode acarretar problemas persistentes de ereção em cerca de 10 a 60% dos pacientes e incontinência urinária em cerca de 5 a 30% – com as frequências variando conforme a idade, a cirurgia e a fonte das estatísticas. Isso significa que, para cada homem com a vida salva, inúmeros outros tiveram diagnósticos de câncer em vão e sofreram complicações decorrentes do tratamento – uma balança que, embora apontasse para uma redução de mortalidade, fazia do PSA uma faca de dois gumes.
Os entusiastas do PSA, em sua maioria urologistas, leram os dados com perplexidade – depois de anos realizando o exame e tratando pacientes com taxas de cura acima de 90%, como era possível que o rastreamento não tivesse forte impacto na mortalidade? Para entender isso, é necessário considerar algo contraintuitivo em nosso imaginário: que o câncer não é invariavelmente uma doença fatal quando não tratada, e que em alguns casos ele pode conviver em paz por décadas com seu hospedeiro.
A existência de tumores de próstata com comportamento pouco ou nada agressivo não era novidade. Ao longo dos anos, autópsias em homens falecidos por causas que nada tinham a ver com a próstata já haviam documentado que, ao se fatiar o órgão e examinar suas células, não era incomum encontrar tumores que jamais haviam incomodado seu portador. A incidência destes cânceres dependia da idade – de cerca de 30% em homens de 30 a 39 anos a mais de 80% em homens entre 70 e 79 anos. Na faixa etária em que a frequência do exame de PSA costuma ser maior (entre 50 e 69 anos), mais da metade dos homens apresentará um câncer se a próstata for submetida a uma autópsia cuidadosa – algo que naturalmente não pode ser feito em um indivíduo vivo, do qual apenas alguns fragmentos da glândula serão analisados após uma biópsia.
Como apenas 3% das mortes na população masculina decorrem do câncer de próstata, a conclusão inevitável é que a maioria desses tumores, ainda que possuam características típicas se examinados ao microscópio, nunca chegará a matar o indivíduo – e frequentemente sequer lhe trarão problemas. É muito mais provável que um indivíduo morra com um câncer de próstata, mas por outras causas, do que devido ao câncer de próstata. Isso leva à conclusão de que, para a maior parte dos homens, a detecção de um tumor de próstata assintomático gerará um fenômeno conhecido como "sobrediagnóstico": o diagnóstico de condições que nunca levariam a sintomas ou morte – o que por definição não trará benefícios, mas apenas prejuízos. No caso do câncer, basta ouvir o diagnóstico da doença para a vida sofrer um impacto tremendo. Além disso, o tratamento traz riscos reais: embora a mortalidade por cirurgias da próstata seja muito rara, complicações como impotência sexual e incontinência urinária são comuns.
Desta forma, é provável, a julgar pelas estatísticas, que inúmeros indivíduos "curados" pela detecção precoce da doença representem na verdade pacientes com tumores que nunca viriam a se manifestar se um médico não tivesse procurado por ele com o PSA. Isso também explica em grande parte por que as taxas de cura do câncer de próstata na fase inicial são tão altas – na prática, os ensaios clínicos mostram que a maior parte desses tumores não seria responsável pela morte do sujeito mesmo que eles não fossem tratados. Um estudo americano com 367 pacientes diagnosticados precocemente, não submetidos a uma intervenção imediata, mostrou que, após quase vinte anos de acompanhamento, apenas 11% deles haviam morrido devido à doença, e a maioria nunca havia apresentado sintomas dela.
Nos números sobre a "taxa de cura", o sobrediagnóstico ainda se soma a um fenômeno conhecido como "viés de antecipação". Como os cânceres de próstata que causarão sintomas demoram anos a fazê-lo, detectá-los pelo PSA faz com que eles sejam encontrados mais cedo. Assim, mesmo quando a terapia não é efetiva, o tempo de sobrevida contado a partir do diagnóstico é maior – não porque o paciente viva mais, mas porque o tumor foi detectado antes. Com isso, as taxas de sobrevivência em cinco anos tradicionalmente usadas para expressar a "curabilidade" do câncer sempre parecerão melhorar com o rastreamento, mesmo que ele não ofereça benefício – o que faz com que elas constituam uma estatística tremendamente enganosa.
Éclaro que nem todos os tumores detectados pelo PSA são tratados em vão – é provável que em alguns pacientes o ideal de "detectar o câncer antes que ele se manifeste e possibilitar a cura" realmente se concretize. O grande problema é que é impossível distinguir com precisão quem se beneficiará do tratamento de quem só experimentará malefícios – embora algumas pistas, como o aspecto microscópico do tumor, possam sugerir uma coisa ou outra. O máximo que se pode fazer é estimar os riscos por meio de dados populacionais como os dos grandes ensaios clínicos randomizados – e estes sugerem que o número de pacientes prejudicados é maior do que o de beneficiados, ainda que se possa argumentar que o impacto positivo de uma vida salva seja maior do que o impacto negativo das complicações.
Depois da publicação dos resultados dos ensaios clínicos europeu e americano, a grande maioria das sociedades médicas no mundo retrocedeu quanto a aconselhar o PSA. A posição mais impactante foi a da United States Preventive Services Task Force (USPSTF), agência governamental americana encarregada de indicar exames preventivos. Ao contrário de outras entidades, antes de 2009 ela nunca se manifestara a favor do rastreamento, alegando ausência de provas. Em 2012, passou a recomendar ativamente que os homens não o realizassem, julgando que os riscos superavam os benefícios.
Outras entidades foram mais cautelosas, mas ainda assim recuaram. Em 2013, a Associação Americana de Urologia alteraria suas diretrizes, passando a aconselhar que pacientes entre 55 e 69 anos fossem informados sobre os riscos e as vantagens do rastreamento, a fim de que decidissem realizá-lo ou não – uma recomendação que a literatura médica denomina "decisão compartilhada". No Brasil, em 2011 o Inca aconselhou que não se fizessem programas nacionais de rastreamento, postura mais tarde ratificada pelo Ministério da Saúde. Por fim, quase todas as instituições são contra a prática em pacientes de mais de 70 anos, já que após essa idade é enorme o contingente de homens com câncer de próstata, mas a maior parte destes tumores simplesmente não terá tempo de causar sintomas.
Ainda que a polêmica permaneça, com evidências surgindo a todo momento e levando a mudanças de posição, um observador atento à literatura científica seria forçado a concluir que o rastreamento do câncer de próstata é uma questão controversa, que deveria no mínimo ser encarada com cautela. Fora dos periódicos médicos, porém, a realidade nem sempre segue o que é preconizado pela literatura.
Na avenida Paulista, a onipresença do Novembro Azul logo se faz notada. Em poucos minutos, topo com um outdoor eletrônico da campanha, cortesia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. No site do hospital, a mensagem é clara: "Todo homem a partir dos 50 anos deve consultar um especialista e realizar periodicamente os exames que detectam precocemente o câncer de próstata." Não é difícil entender a visibilidade da campanha por aqui: num raio de 500 metros da Paulista, conto pelo menos oito hospitais no Google Maps, o epicentro da saúde privada no Brasil.
Caminho em direção à Beneficência Portuguesa, onde uma palestra sobre câncer de próstata dá início a um ciclo de bate-papos dedicado à saúde do homem. Na recepção do hospital, há um cartaz enorme com o slogan "Bigode também pode: todos devem se cuidar". Ao lado, um pôster com o logotipo da campanha adverte que "o diagnóstico precoce é essencial para a prevenção do câncer de próstata". Logo abaixo, informa um telefone para agendamento de exames preventivos.
Faltando cinco minutos para o evento começar, conto sete pessoas sentadas, das quais seis são mulheres. Quase o número de funcionários que trabalham no evento: uma menina que distribui folhetos, dois sujeitos que operam o som, a moça que coordena a produção e a fotógrafa. Enquanto espero a palestra, ganho uma sacola azul com um folheto de propaganda e um bloquinho. A garota dos brindes cola um adesivo no meu peito, que não tenho coragem de recusar.
O palestrante de hoje é o urologista Celso Heitor de Freitas Júnior, do corpo clínico da Beneficência. Ele começa dizendo que "a campanha tem um valor imenso", pois são raros os homens que procuram o urologista espontaneamente – em geral são levados pelas mulheres. Menciona a alta incidência do câncer de próstata e logo passa à estatística clássica de que, se detectado na fase inicial, ele tem taxa de cura de mais de 90%. Explica que o PSA é um "simples exame de sangue" e que o toque retal é um exame desconfortável, mas indolor e rápido, durando de cinco a dez segundos. A mensagem é clara: "O homem tem que fazer o toque retal e a coleta do PSA para a prevenção do câncer", diz o palestrante. "Quando começar? A partir dos 50 anos, se o homem não tiver nenhuma dificuldade para urinar nem algum familiar direto com a doença." "Nosso trunfo é o diagnóstico precoce", conclui ele. "Se a pessoa chega tarde e temos que controlar a doença sem poder curá-la é muito triste."
Alguém pergunta se a cirurgia é recomendada sempre, e o médico diz que nos casos avançados ela não vale a pena, visto que pode ter efeitos colaterais; em casos iniciais, é o tratamento que dá ao paciente a maior chance de sobreviver. Também menciona que, para tumores de baixo risco, pode-se indicar uma abordagem menos radical. Conclui lembrando a questão da impotência: a doença não provoca a condição, mas a terapia pode causá-la. Mesmo assim, é otimista em relação aos efeitos colaterais do tratamento, salientando que são tratáveis. Diz que a cirurgia e a radioterapia progrediram muito, passando de índices de 80 a 100% de impotência para ao redor de 20%. Quais as chances de recidiva? "Se descoberto no início, a gente pega o tumor numa fase não tão agressiva e a chance de retorno não passa de 10%. E até esses a gente pode curar depois."
Ao final da palestra, me apresento ao médico, que se mostra atencioso às minhas dúvidas. Quando o questiono sobre a polêmica em relação ao rastreamento, ele se revela bastante a par do assunto e diz ter reservas quanto à prática. "Hoje não temos evidências contundentes de que o rastreamento populacional valha a pena. A gente teria que tratar muita gente para evitar uma morte, e essas pessoas seriam vítimas de um sobretratamento, seriam tratadas além do necessário." Também argumenta que "a gente tem uma preocupação com não tratar demais, assim como os epidemiologistas, até porque isso pode quebrar um sistema de saúde, como ocorreu nos Estados Unidos". Por outro lado, reconforta-o saber que pacientes com doença mínima podem hoje ser acompanhados sem tratamento imediato – o que se chama de "vigilância ativa". Assinala que, salvo pacientes com fatores de risco, quem se beneficia do rastreamento, segundo as diretrizes das associações Americana e Europeia de Urologia, é a população de 55 a 70 anos. "Então acho que cada vez mais nós vamos estimular a prevenção com idade de início e idade de fim", mencionando que por vezes é procurado por homens de 80 anos para fazer o exame e tem de dissuadi-los.
Visto que a "idade de fim" do rastreamento não foi citada na palestra – que tampouco mencionou as demais controvérsias sobre sua eficácia –, pergunto se os octogenários em busca do exame não seriam um efeito colateral do Novembro Azul. Ele discorda. "As campanhas são fundamentais, porque nossos números de câncer de próstata ainda são subnotificados. E na era pós-PSA houve uma redução de mortes por câncer de próstata." Eu indago se a campanha não simplifica demais uma questão complexa, mas ele responde que levantar esse tipo de polêmica seria muita informação para o público, e talvez confundisse a cabeça das pessoas, já cheia de mitos a respeito do tema. Encerro pedindo informações sobre o ciclo de bate-papos, e ele me diz para procurar Shirley, a produtora. Quando a abordo, ela diz que só cuida da organização. "Quem define o conteúdo do evento e entra em contato comigo é o departamento de marketing."
Marketing é uma das primeiras palavras que vem à cabeça de quem visita o Instituto Lado a Lado pela Vida, responsável pelo Novembro Azul. Em sua sede, num sobrado no Jardim Paulista, espalham-se na mesa da sala de espera livros da campanha Arte de Viver – com poemas e pinturas de pacientes psiquiátricos – produzidos pelo instituto em parceria com o laboratório Janssen-Cilag, fabricante dos antipsicóticos HaldolR, RisperdalR e InvegaR. Nas estantes, livros sobre saúde se encostam em troféus de prêmios de sustentabilidade. O banheiro está abarrotado de folhetos e bigodes.
A ubíqua Marlene Oliveira, presidente do instituto, me recebe. Jornalista de formação, há muitos anos ela organiza eventos por meio da empresa RV Mais, responsável por diversos congressos médicos de grande porte. Marlene conta que, no início dos anos 2000, entre seus clientes estava Eric Wroclawski, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia, que sucumbiria a um câncer de próstata em 2009, aos 56 anos. "Na fase final da doença dele, o dr. Eric falou pra mim: ‘Marlene, você faz tantas coisas interessantes na área médica. Convivendo agora com a doença, sinto que faltam pessoas para falar sobre saúde do homem’." Pouco antes de morrer, ele sugeriu a Oliveira que fizesse algo para informar o público e delineou os eixos do projeto que ela viria a tocar.
A jornalista começou com um site sobre a saúde do homem, construído com material obtido junto a médicos que ela conhecia por meio de sua atividade profissional. A iniciativa deu certo, e a fez criar o Instituto Lado a Lado pela Vida, uma organização da sociedade civil de interesse público cujo propósito é levar informações de qualidade para as pessoas, focando na prevenção. A partir daí, surgiram empresas atrás de conteúdo para oferecer a colaboradores e funcionários, e Oliveira idealizou uma campanha relacionada ao câncer de próstata.
Ela foi ao Congresso Americano de Urologia e falou com representantes do Movember, campanha originada na Austrália que, para conscientizar os homens sobre questões de saúde e angariar fundos para pesquisa, incita-os a cultivar bigodes no mês de novembro. "Mas aqui no Brasil você não tem a cultura da doação, né? Tentamos fazer algo parecido em 2008, 2009, e não conseguimos. Íamos nas empresas e o pessoal tirava sarro. O brasileiro se negou a deixar o bigode crescer", ela lembra. Ocorreu-lhe então espelhar-se no Outubro Rosa, campanha de prevenção do câncer de mama, e assim surgiu o Novembro Azul. "Trata-se de um movimento nacional, ele não é internacional como as pessoas dizem. Foi criado por nós, e a gente tem que se orgulhar disso." Ao contrário do Movember, o Novembro Azul tomaria como bandeira a detecção precoce. O carro-chefe da campanha seria convocar os homens a procurar o médico e solicitar exames de rastreamento – com ênfase em desfazer o preconceito atrelado ao exame de toque retal.
A partir da criação do Novembro Azul em 2012, empresas e pessoas físicas aderiram à iniciativa com doações financeiras e serviços. A presidente conta que, em 2016, a Fiesp, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, contribuiu com quase 1 milhão de folhetos. Médicos do comitê científico do instituto se oferecem para dar palestras e entrevistas, bem como escrever e revisar o material de divulgação. Atualmente, a campanha arrecada cerca de 2 milhões de reais por ano, que também ajudam a sustentar a estrutura do Lado a Lado pela Vida. A jornalista ressalta que seus proventos pessoais vêm exclusivamente de seu trabalho como organizadora de eventos: "No instituto, eu atuo 100% como doação."
O site do Novembro Azul lista como parceiros institucionais ou mantenedores associações médicas como a SBU e a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, bem como uma série de empresas, em geral farmacêuticas. A campanha disponibiliza uma infinidade de materiais didáticos sobre questões relacionadas à saúde do homem, em geral com foco na prevenção do câncer de próstata, mas também abordando assuntos como DSTs e doenças cardiovasculares. O conteúdo é elaborado pelo comitê científico, composto de profissionais da saúde que trabalham como voluntários. O site traz as fotos dos 45 profissionais do comitê – entre os doze urologistas, incluem-se o atual presidente da SBU, Archimedes Nardozza, bem como o ex-presidente Aguinaldo Nardi.
Quando abordo a controvérsia do rastreamento – e o fato de as orientações da campanha irem contra as recomendações atuais de instituições como o Inca e o Ministério da Saúde –, Oliveira é rápida no gatilho: o instituto segue as diretrizes da SBU. O posicionamento oficial da entidade em seu próprio site, porém, é mais ponderado do que o material de campanha, afirmando que "homens acima de 50 anos devem procurar um médico e o rastreamento deve ser realizado após ‘ampla discussão de riscos e potenciais benefícios’". Questionada sobre a discrepância de tom, ela retruca que são as próprias sociedades parceiras que elaboram as recomendações, revisam o material e aprovam a campanha. "Isso é o papel da sociedade médica, nós aqui levamos a informação. Se a orientação for outra, a gente vai mudar."
Tento explicar a ela a existência de posicionamentos distintos falando dos problemas do sobrediagnóstico e dos efeitos colaterais do tratamento, mas me sinto pregando no deserto. "E aí, o que é que você faz se o homem não tem informação sobre cuidar da saúde? E quando ele vai ao sistema de saúde, ele chega numa fase avançada do câncer de próstata", diz Oliveira. "O que não vamos aceitar é o número de homens que morrem por negligência. Não posso deixar homens morrerem. O que eu vou fazer, ficar aqui com a bandeirinha do mst dizendo que sou contra?"
Pouco afeito a misturar o sentimento de urgência a questões complexas, digo que talvez nesse momento a gente não tenha certeza sobre o que fazer. Mas ela contra-ataca: "Tenho certeza de que a campanha está ajudando a fazer com que o homem vá ao médico. Isso pra mim é mérito. E não tem sociedade nenhuma, nem de urologia ou oncologia, que tire isso de nós." Quando menciono que entidades em outros países também assumem posturas diferentes, ela responde: "Mas não tem o task force lá nos Estados Unidos, que está sendo revisto? Com a história do Ben Stiller, que veio a público pra falar do câncer dele, parece que está havendo várias discussões."
Ben Stiller, astro das comédias Quem Vai Ficar com Mary? e Uma Noite no Museu, parece um erro de casting nessa novela. Mas quando entro no site da Sociedade Brasileira de Urologia no início de novembro, é com uma foto dele que topo, junto à manchete "Ator Ben Stiller defende exames de detecção do câncer de próstata." Clico na notícia e fico sabendo que, em outubro de 2016, o ator, então com 50 anos, revelou ter sido diagnosticado com câncer de próstata dois anos antes. "Segundo Stiller, graças à realização precoce do exame PSA, ao qual era submetido periodicamente desde os 46 anos a pedido de seu urologista, ele foi diagnosticado cedo e ficou curado da doença."
Clico nos links e leio o texto original de Ben Stiller, "O teste de câncer de próstata que salvou a minha vida". O processo que culminou em seu diagnóstico teve início com um teste de PSA, pedido por um clínico geral (e não por um urologista, como diz a página da SBU). Seguiu-se o roteiro padrão: o resultado levou a uma nova dosagem do antígeno, que levou a uma ressonância magnética, que levou a uma biópsia de próstata, que levou a um diagnóstico de câncer, que levou a uma cirurgia para a retirada da glândula. Ao refletir sobre a importância do PSA, o ator não pestaneja: "Se, como a Sociedade Americana de Câncer recomenda, meu médico tivesse esperado até os 50, eu saberia do tumor só dois anos depois que fui tratado. Se ele tivesse seguido o USPSTF," [a agência americana que regulamenta os exames] "eu nunca seria testado, e não saberia que tinha câncer até que fosse tarde demais para tratá-lo com sucesso."
Os números nos mostram, porém, que a lógica do raciocínio de Stiller é incerta. Ele pode estar certo a respeito de ter sua vida salva pelo exame, mas também pode ser um caso de sobrediagnóstico do câncer de próstata. Se Stiller estivesse no grupo do sobrediagnóstico – ao que tudo indica mais numeroso do que o dos homens cujas vidas foram salvas –, tudo o que teria ganho com o exame seria a "montanha-russa maluca" (em suas próprias palavras) de um diagnóstico de câncer e os efeitos colaterais da cirurgia, como as alterações em sua vida sexual, relatadas em entrevista ao radialista Howard Stern: "O sexo leva tempo para voltar. A cirurgia muda a experiência do que é um orgasmo. É ótimo, mas é diferente."
Esse caso ilustra um paradoxo da medicina: em um paciente individual, é impossível saber se detectar um tumor foi benéfico mesmo após o tratamento. Se o indivíduo foi diagnosticado, tratado e o câncer não voltou, é sempre possível que ele nunca fosse se manifestar. Já em um paciente que não realizou o exame de PSA e acabou morrendo de câncer, tampouco há como saber se sua vida teria sido salva caso o diagnóstico tivesse sido feito. Podemos no máximo estimar os riscos através de dados populacionais como os dos ensaios clínicos randomizados – e estes sugerem que os prejudicados pelo diagnóstico são mais numerosos que os beneficiados.
Por mais que Stiller esteja por dentro da polêmica, ele não parece cogitar que sua vida pode não ter sido salva pelo exame – impressão comum em quem se tratou e não experimentou a recidiva. Seres humanos são afiados em estabelecer causalidade entre fatos, e mais ainda em equacionar "câncer" e "morte iminente". Se Stiller tinha um tumor, realizou o tratamento e depois não tinha mais, logo ele teve sua vida salva. E mesmo uma avalanche de dados não mudará sua opinião, o que não surpreende: depois de já se ter realizado um tratamento, há poucas vantagens em questioná-lo e pensar que os transtornos decorrentes podem ter sido em vão. Mais reconfortante é achar que se teve a vida salva, e transformar um processo sofrido em razão de alegria.
Já o arrependimento por não fazer um exame parece bem mais comum. Em 2004, o americano Daniel Merenstein publicou um contundente ensaio no Journal of the American Medical Association, no qual conta como, durante sua residência médica, discutiu com um paciente de 53 anos os riscos e benefícios do exame de PSA, que o homem preferiu não fazer. Meses depois, outro médico solicitou o teste, cujo resultado foi positivo. O paciente acabou diagnosticado com um câncer incurável e processou o programa de residência de Merenstein. No início do julgamento, o médico estava confiante – a discussão sobre fazer ou não o exame estava registrada no prontuário, e a conduta tomada tinha o respaldo da maior parte das entidades médicas. Ainda assim, a impressão de que algo poderia ter sido feito foi o bastante para motivar o processo, e também para convencer o júri. O programa de residência foi condenado a pagar uma multa de 1 milhão de dólares, embora, a rigor, Merenstein tivesse seguido as recomendações científicas disponíveis. Em tom pessimista, o autor encerra o artigo dizendo "não saber se gostaria de praticar medicina de novo".
A convicção do júri sobre a culpa de Merenstein é a imagem em espelho da convicção da cura de Ben Stiller. Ambas decerto ilusórias, mas naturais: pacientes e jurados são humanos, habituados a buscar relações de causa e efeito. Tão humanos, aliás, quanto aqueles que sentam do outro lado da mesa do consultório.
Alfredo Canalini, professor de urologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e tesoureiro da SBU, me recebe num dia movimentado em seu consultório no Jardim Botânico. Venho para tirar dúvidas sobre o posicionamento da entidade sobre o rastreamento. Historicamente, a sociedade urológica tem apoiado a prática e, de acordo com Marlene Oliveira, é a responsável pelo conteúdo do Novembro Azul, amplamente favorável à detecção precoce. Por outro lado, a posição oficial da SBU, publicada em seu site ao lado da notícia sobre Ben Stiller, é ambígua e difícil de compreender.
O texto inicia dizendo que "o rastreamento universal de toda população masculina (sem considerar idade, raça e história familiar) não parece ser a melhor abordagem". Logo depois, chama de "equivocada" a decisão da agência americana de contraindicar o exame, mencionando que isso levou a um aumento na porcentagem de tumores diagnosticados em estágios mais tardios nos Estados Unidos. Por fim, diz que "homens a partir dos 50 anos devem procurar um profissional especializado para avaliação individualizada" e que "o rastreamento deverá ser realizado após ampla discussão de riscos e potenciais benefícios", o que me pareceu um passo rumo à "decisão compartilhada" advogada pela contrapartida americana da SBU. Ainda assim, Ronaldo Damião, colega de Canalini na Uerj e ex-presidente da sociedade, me assegurou que a recomendação do rastreamento por parte da SBU seguia valendo. "A maioria das diretrizes no mundo recomenda fazer o exame de PSA. Só os Estados Unidos propõem a discussão com o paciente. E o texto da SBU não diz que é para fazer isso", afirmou.
Em seu consultório, Canalini confirma que a sociedade recomenda que todos procurem um urologista para realizar o rastreamento. Quando pergunto sobre as razões, dada a evidência disponível, ele me dá o exemplo de um paciente diagnosticado com 42 anos que foi operado por ele e ficou curado. "Ele iria morrer de câncer de próstata." Eu argumento que é impossível sabê-lo – uma vez tratado, nunca saberemos se aquele câncer teria significado clínico, mas ele discorda. "Não, ele iria morrer. Porque com 42 anos o câncer de próstata tem significado clínico."
Talvez ele esteja certo. Talvez não. Independentemente disso, exemplos como os de Ben Stiller e de Canalini nos mostram que é difícil abordar de modo racional a questão – seja com pacientes, seja com médicos. "Pode perguntar aos urologistas do Inca se eles mesmos não fazem exame de PSA. É claro que fazem", já havia me dito Damião. Nesse sentido, a maior parte dos urologistas com quem conversei é coerente em sua posição, inclusive enquanto paciente. "Eu faço check-up anual e PSA", afirma Canalini. Ele não está sozinho: em um levantamento de artigos publicados na mídia brasileira entre 2006 e 2016, 88% dos depoimentos de urologistas expressavam posições favoráveis ao exame.
possível que a impressão psicológica causada pelo contato com pacientes com câncer de próstata avançado desempenhe um papel nesse posicionamento. Apesar de a doença em geral evoluir devagar, seu avanço pode ser inclemente, levando à obstrução urinária e culminando em insuficiência renal; ao se espalhar pelo corpo, o câncer tem uma predileção pelos ossos, podendo ocasionar fraturas e dores crônicas de difícil controle. Algumas semanas antes de minha conversa com Canalini, no ambulatório de urologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, fui demovido do posto de observador para auxiliar o médico-residente a trocar sondas vesicais e bolsas de coleta de pacientes com câncer de próstata avançado.
Um deles contou que havia tido um PSA alterado dois anos antes, mas que tinha "ouvido os amigos" e não procurou ajuda logo de cara. Com isso, foi tratar-se apenas depois de ter os dois ureteres obstruídos e uma insuficiência renal. Um segundo paciente vem tratar uma fístula entre a bexiga e o reto, consequência de uma cirurgia complicada pelo avanço da doença. Ao conversar com eles, de fato é difícil não se comover. Tal sentimento não basta para defender o rastreamento: não se pode dar por certo que os pacientes teriam sido salvos das complicações que apresentaram caso tivessem realizado um exame de PSA mais cedo. Ainda assim, é quase impossível não pensar que gostaríamos de ter feito algo para evitar tudo aquilo.
Afora isso, existem argumentos racionais em favor do rastreamento, que têm aumentado nos últimos anos. Com a intensificação da prática da "vigilância ativa" – o monitoramento de tumores de baixo risco sem necessidade de terapia imediata –, o impacto negativo do tratamento sobre a qualidade de vida tem sido evitado, ou pelo menos retardado. A estratégia não é desprovida de riscos – estudos mostram que, passados dez anos, a incidência de metástases é maior, e que depois de vinte anos mais pacientes submetidos à observação morrem por câncer de próstata, se comparados àqueles operados imediatamente. Não obstante, a observação proporciona uma qualidade de vida maior logo após o diagnóstico, e é uma alternativa para pacientes de baixo risco – mesmo que uma fração significativa acabe sendo tratada posteriormente devido a sinais de progressão da doença. Por esse motivo, a fração de casos de câncer de próstata submetidos à vigilância ativa pulou de 14% para 40% nos Estados Unidos entre 2009 e 2013, ainda que não seja possível dizer se isso também ocorreu no Brasil.
Exames como a ressonância magnética de próstata também têm ajudado a selecionar casos de PSA elevado com maior risco, poupando biópsias desnecessárias. Embora o exame, de custo relativamente alto, seja pouco difundido no sistema público brasileiro, cada vez mais ele tem se tornado uma realidade na saúde privada. A busca por marcadores sanguíneos de desempenho melhor do que o do PSA também é intensa, mesmo que por ora não haja um substituto óbvio.
A evidência de diminuição de mortalidade com o rastreamento também tem se fortalecido à medida que aumenta o tempo de seguimento dos pacientes nos ensaios clínicos. À época de sua publicação, em 2009, o grande ensaio clínico europeu mostrava uma redução de mortalidade de 20%, com 48 homens tratados para cada vida salva após nove anos. A atualização mais recente do estudo, de 2014, revela que a redução de mortalidade após treze anos aumentou para 27%, e o número de homens a serem tratados para salvar uma vida diminuiu para 27 – fatos que comprovam que, dado o crescimento lento do tumor, os benefícios do rastreamento podem levar tempo a aparecer. No resultado mais positivo até agora, um estudo sueco com 20 mil homens encontrou uma redução de mortalidade de 40% após catorze anos com a realização do PSA a cada dois anos – embora, devido ao número menor de indivíduos, a margem de erro seja ampla, não sendo possível afirmar que o benefício seja realmente diferente do visto no estudo europeu.
Mais significativas ainda foram as dúvidas lançadas sobre os dados do ensaio clínico americano que não registrou queda de mortalidade pelo rastreamento. Uma análise recente revelou que, dentre os homens no grupo de controle – aquele que não foi submetido ao rastreamento sistemático –, quase 90% deles haviam realizado pelo menos um teste de PSA durante o estudo. Como a testagem se tornara rotineira nos Estados Unidos, antes mesmo que sua eficácia fosse comprovada, era quase impossível atravessar os seis anos de seguimento sem que algum médico acabasse pedindo o exame em uma consulta não relacionada à pesquisa. Com isso, os grupos acabaram não se diferenciando muito ao fim do trabalho, já que quase todos os sujeitos fizeram exames de PSA – o que ilustra a dificuldade de testar uma intervenção médica depois de ela se tornar corriqueira.
Talvez o maior indicador de que o fiel da balança científica tenha voltado a pesar a favor do rastreamento seja o fato de que o USPSTF, a agência americana que em 2012 militava pela não realização do exame, abriria para consulta pública, em abril de 2017, uma proposta de mudança em sua recomendação, de modo a aproximá-la daquela da Associação Americana de Urologia – ou seja, a de que homens entre 55 e 69 anos sejam informados sobre riscos e benefícios da prática para tomarem sua própria decisão. Com isso, autoridades governamentais e sociedades médicas, pelo menos nos Estados Unidos, parecem voltar a convergir para uma mesma postura: a da dúvida, que preconiza não ser possível afirmar o que é melhor sem a ajuda do paciente.
A dificuldade de pesar riscos e benefícios decorre da natureza distinta de ambos: é melhor aumentar as chances de impotência ou de incontinência urinária num futuro próximo para diminuir as de um câncer fatal num futuro distante? Em última análise, apenas os pacientes podem optar. O que não impede que muita gente queira opinar por eles. "É claro que a decisão é compartilhada", concorda Canalini. "Mas a recomendação da SBU é que os homens façam o exame se quiserem, pois ele salva vidas."
No site da Med-Rio, empresa especializada em check-ups baseada em Botafogo e na Barra da Tijuca, vistas da Baía da Guanabara e da Pedra da Gávea se sobrepõem a mensagens que estimulam o internauta a agendar seus exames. Um vídeo informa que a empresa é líder nacional em medicina preventiva, já tendo realizado mais de 120 mil check-ups. Que o programa, com duração de cinco horas, inclui doze avaliações médicas completas. Que, depois da coleta dos exames, o paciente tem direito a um café da manhã ou lanche da tarde preparado pelo chef Roland Villard. Surge então no vídeo o diretor da clínica, Gilberto Ururahy, dizendo que "melhor que curar é prevenir". Em meio a um quilométrico rol de exames, está o PSA, que o site recomenda a partir dos 40 anos.
Do outro lado da cidade, no Carioca Shopping, localizado na Vila da Penha, o mesmo exame aparece no cardápio da Policlínica Granato, especializada em consultas e exames a preços populares. Em suas ações no Novembro Azul, realizadas tanto em sua filial no shopping como no Parque Madureira, a clínica oferece dosagens gratuitas do antígeno. "Não podemos esquecer que, na interpretação do resultado do PSA, é preciso considerar idade, história clínica, volume prostático e uso de medicação. Por esta razão é imprescindível que um urologista seja consultado regularmente", explica Paulo Granato, médico e CEO da empresa, que também agenda consultas com especialistas. A Clínica Dr. Emerson, com diversas filiais na Baixada Fluminense, é ainda mais incisiva. Com a mensagem de que "o exame de próstata salva vidas, inclusive a sua!", ela anuncia que "os exames de PSA Total e Livre estão com um SUPER DESCONTO: de 100 reais por 49,90. OS DOIS EXAMES PELA METADE DO PREÇO!"
E se o Novembro Azul não respeita fronteiras de classe, por que se importar com as da espécie? Na reportagem "Campanha do Novembro Azul também é válida para cães e gatos", o veterinário Tiago Ladeiro de Almeida explica que "o mais importante, como no ser humano, é a prevenção, levando o animal rotineiramente ao médico veterinário para exames que poderão identificar precocemente uma afecção em desenvolvimento. Quanto mais cedo o diagnóstico, melhores as chances de tratamento". Não importa que a doença corresponda a apenas 0,67% dos cânceres caninos. E tampouco que, se estudos com quase 200 mil pacientes não definiram a questão do rastreamento em humanos, a convicção de que valha a pena fazê-lo num chihuahua pareça no mínimo estranha.
ão é segredo que o diagnóstico precoce movimenta um mercado portentoso, no qual o exame de NPSA por si só representa apenas uma fração. Não por acaso, as campanhas de rastreamento foram iniciadas nos Estados Unidos pela indústria farmacêutica, num padrão repetido pelo Novembro Azul: os parceiros da campanha incluem os laboratórios Astellas (fabricante do XtandiR), Janssen-Cilag (fabricante do ZytigaR), Bayer (fabricante do XofigoR), Eurofarma (fabricante do genérico bicalutamida) e Abbott (que desenvolve a droga experimental atrasentan). Todos os medicamentos, previsivelmente, são utilizados para o câncer de próstata avançado.
Um observador ingênuo poderia pensar que as farmacêuticas estariam fazendo um desserviço a seus lucros – afinal, o diagnóstico precoce não deveria barrar o avanço da doença? Sim, mas a diminuição na parcela dos casos incuráveis, que de fato ocorre, é compensada pelo aumento estratosférico no número total de diagnósticos de câncer de próstata. No início dos anos 90, quando o teste de PSA foi introduzido no mercado americano, o número anual de novos casos dobrou – no final dos anos 80 eram cerca de 180 por 100 mil habitantes; no início dos 90, por volta de 350. E ainda que na sequência este número tenha diminuído, ele só retomaria os índices dos anos 80 depois que o exame deixou de ser recomendado pela agência governamental.
Com isso, a diminuição na porcentagem de tumores diagnosticados em estágio avançado parece dever-se mais ao aumento de casos diagnosticados precocemente – dos quais vários nunca se manifestariam – do que por uma diminuição nos casos avançados, cujo número tem permanecido relativamente estável. E mesmo que a longo prazo alguns cânceres avançados possam ser prevenidos, isso não levará necessariamente a uma redução do emprego dos medicamentos. Pelo contrário, parte dos tumores curáveis por radioterapia também são tratados com eles; além disso, como casos avançados serão diagnosticados mais cedo, a terapia (que costuma se estender pela vida inteira) acaba ocorrendo por mais tempo. Assim, é provável que o engajamento dos laboratórios nas campanhas de rastreamento não seja apenas um gesto filantrópico.
A indústria farmacêutica, no entanto, só retém parte dos lucros. Ao longo dos últimos anos, o tratamento cirúrgico da doença tem privilegiado a cirurgia robótica, na qual o profissional maneja, a distância, braços mecânicos que retiram a próstata do paciente. Tal técnica, que reduz os riscos associados à cirurgia, exige um equipamento de última geração; na Intuitive Surgical, líder desse mercado, ele custa cerca de 2,5 milhões de dólares. O último relatório para investidores registra que a empresa já instalou 4 149 sistemas ao redor do mundo, dos quais pelo menos 23 no Brasil, com um faturamento total de 2,7 bilhões de dólares no ano anterior.
O número de cirurgias anuais para o câncer de próstata nos Estados Unidos, que era de 34 mil no final dos anos 80, saltou para 104 mil entre 1992 e 1993 com a introdução do PSA. Em 2010, foram 138 mil procedimentos, dos quais cerca de dois terços por cirurgia robótica. Os lucros com o câncer de próstata também são partilhados por outros agentes, como os centros de radioterapia. Nos Estados Unidos, a adoção da radioterapia com feixes de prótons levou à construção de clínicas de mais de 100 milhões de dólares, sustentadas em larga medida pelo influxo de pacientes com câncer de próstata, mesmo sem provas de que tal terapia obtenha mais sucesso do que a radioterapia tradicional.
Engana-se quem acredita que o mercado se esgota após a cura da doença. Num improvável exemplo da extensão do negócio, em 2009 a Kimberly-Clark, gigante de produtos de higiene pessoal, lançou nos Estados Unidos uma campanha de conscientização sobre o câncer de próstata. O que a empresa tem a ver com a doença? Acertou quem disse "forros e fraldas geriátricas" – campo em que a marca DependR é líder de mercado. Os casos de incontinência não costumam decorrer do tumor em si – que geralmente obstrui a passagem da urina. A incontinência é mais frequente como efeito do tratamento, com aproximadamente 15% dos pacientes utilizando dispositivos higiênicos para contornar o sintoma depois da cirurgia – o que faz com que a empresa lucre com os malefícios do exame de PSA, mais do que com suas vantagens.
Dentre os beneficiários da cultura do exame de próstata, poucos ganham tanto quanto os urologistas. O Novembro Azul diz e repete que homem não costuma ir ao médico, ao contrário da mulher, que todo ano vai ao ginecologista (hábito, aliás, associado aos exames para prevenção do câncer de colo de útero). Na consolidação do exame de próstata como rito anual, assim, está embutida a possibilidade de todo homem ter o "seu urologista" – com consequências de mercado nada desprezíveis. "No consultório de um urologista, sem incluir as urgências, pelo menos 50% do movimento passa pelo rastreamento", diz Brasil Silva Neto, professor de urologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e defensor da "decisão compartilhada".
O movimento de consultório que o PSA proporciona é apenas o estopim do conflito de interesse dos urologistas com o câncer de próstata. Se o exame for positivo, em geral serão eles que realizarão uma biópsia. Se a biópsia for positiva e for indicada uma prostatectomia, também serão eles os responsáveis pela cirurgia. E, se o procedimento acarretar complicações como impotência sexual ou incontinência urinária, será o próprio urologista quem irá tratá-las com cirurgias ou medicamentos. Num modelo que remunera a medicina por serviços prestados – como é o caso da saúde privada no Brasil e na maior parte do mundo –, os proventos do médico vão depender não do bem-estar do paciente ao final do processo, mas do número e da complexidade dos procedimentos realizados.
Tal situação, ainda que paradoxal, é corriqueira na medicina: em termos mercadológicos, nada é tão pouco lucrativo para um médico quanto dizer a um paciente que está tudo bem. "É difícil ganhar dinheiro com o consultório sendo um médico honesto. Você acaba mandando muita gente embora", diz Gustavo Gusso, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, ao comentar a posição contrária da sociedade sobre o rastreamento. "O que funciona é assustar o paciente, e a maior parte dos médicos faz isso."
Honestidade, porém, não é um conceito simples, e seria ingênuo atribuir o apoio dos urologistas às campanhas de rastreamento a uma simples conspiração para amealhar mercado. A maior parte deles parece acreditar no benefício da prática – e existem argumentos razoáveis para sustentá-la. Além disso, perceber pacientes como "curados" – embora seja impossível distinguir cura de sobrediagnóstico – provoca uma sensação poderosa e talvez seja apenas humano que profissionais acreditem na eficácia do que fazem. Um estudo do final dos anos 80 revelou que 79% de uma amostra de urologistas americanos, se diagnosticados com um câncer de próstata localizado, prefeririam tratá-lo com uma prostatectomia. No mesmo estudo, 92% dos radioterapeutas entrevistados disseram que, na mesma situação, optariam pela radioterapia.
Mas mesmo que a convicção dos urologistas seja real, seu conflito de interesse com o rastreamento também é. E é impossível, inclusive para eles, traçar a linha divisória entre a apreciação racional da evidência científica e a convicção motivada por fatores inconscientes, entre os quais o desejo legítimo de ajudar e as perspectivas de lucro se confundem. E seria injusto acusar apenas os urologistas – há séculos a medicina com base em serviços tem na doença seu mecenas. Pois no fundo é a extensão da doença que determina o volume de esforços para detectá-la e tratá-la, bem como os lucros advindos disso. E é inevitável que o capitalismo, com sua obsessão insaciável em "fazer a economia girar", às vezes acabe por maximizar a doença para melhor se alimentar.
No Brasil e na maior parte do mundo, a medicina de família, com sua ênfase na atenção primária e na saúde pública, costuma representar a "esquerda" do espectro médico. Não é surpresa, assim, que numa conferência mundial de médicos de família, realizada no Riocentro em pleno novembro de 2016, seja frequente a opinião de que os excessos da medicina preventiva podem eventualmente fazer mais mal do que bem, e que os pacientes devem ser protegidos deles. Tal posição, chamada de "prevenção quaternária" – ou P4 para os íntimos – designa "ações tomadas para proteger pacientes ou populações sob risco de supermedicalização e protegê-los de intervenções médicas invasivas", um conceito cunhado pelo belga Marc Jamoulle ainda nos anos 80.
Se a P4 algum dia se tornasse uma religião, o espanhol Juan Gérvas seria um de seus líderes espirituais. Em meio a uma sala lotada no Riocentro, com sua indefectível gravata-borboleta, Gérvas despeja sua oratória contra os excessos da medicina. "As estatísticas dos Estados Unidos mostram que, quanto mais especialistas em uma região geográfica, maior a mortalidade", disse. "Quanto mais médicos de família, menos mortalidade. Só por estarem em algum lugar, vocês estão salvando vidas!", ele afirma, para risadas da plateia. Por trás das frases de efeito, se escondem um ativismo militante e uma cultura geral invejável.
Um de seus tópicos preferidos é a defesa dos pacientes contra os excessos da medicina. Algumas das pérolas que escreveu são o artigo "No os midáis el colesterol, sed felices!" ["Não meçam o colesterol! Sejam felizes!"] e o livro São e Salvo: e Livre de Intervenções Médicas Desnecessárias, em parceria com sua mulher, a também médica Mercedes Pérez-Fernandez, uma senhora simpática com mechas coloridas no cabelo grisalho. Antes do início do congresso, Gérvas já criava polêmica – no elevador do hotel Grand Mercure, que hospeda os palestrantes, um cartaz da campanha Outubro Rosa dizia "Previna-se! Faça o autoexame das mamas." Sobre ele, alguém escrevera aumenta cirugías, no disminuye muertes. Ninguém pareceu ter dúvida quanto à identidade do autor. "Tío! Daqui a pouco vão querer que eu faça o autoexame de próstata!", ele exclama, com o indicador entre as pernas para demonstrar o conceito.
Uma das teorias mais curiosas de Gérvas é que "quando o capitalismo fracassa, a saúde melhora". Para sustentar sua hipótese, ele menciona análises econômicas nos Estados Unidos e na Espanha que mostram que maiores taxas de desemprego estão associadas a diminuições de mortalidade – embora o grosso do decréscimo se relacione a acidentes, sobretudo de trânsito. Mesmo que a literatura sobre o tema seja controversa – e sinalize que, durante períodos de crise, indicadores de saúde mental como o número de suicídios recrudesçam, a mensagem de Gérvas é clara: mais dinheiro, mais pujança econômica e mais médicos não necessariamente se traduzem em mais saúde – e podem inclusive afetá-la negativamente.
Uma evidência robusta desse fenômeno pode ser constatada quando se investiga o sistema de saúde americano – de longe o mais caro do planeta, com gastos de 3,2 trilhões de dólares, ou 17,8% do PIB do país em 2015. A despeito disso, uma recente análise de indicadores de saúde propostos pela ONU confere ao país a 28ª posição. Comparações diretas com Inglaterra, Canadá e os países da Escandinávia deixam os Estados Unidos na rabeira, não obstante os gastos destes países com seus sistemas de saúde predominantemente públicos serem bem menores, variando entre 9% e 12% de seus PIBs.
No livro Overtreated: Why Too Much Medicine Is Making Us Sicker and Poorer [Sobretratamento: Por Que Mais Medicina Está Nos Deixando Mais Doentes e Mais Pobres], a jornalista Shannon Brownlee sustenta que o estímulo econômico por "mais medicina" tem prejudicado a saúde dos Estados Unidos. Suas conclusões se escoram em análises da Universidade Dartmouth que mostram que o investimento financeiro e o número de médicos e de hospitais pouco têm a ver com indicadores de saúde. Ao contrário, alguns levantamentos apontam que a mortalidade por certas causas é maior em estados com gastos mais vultosos em saúde.
O fenômeno pode parecer paradoxal, mas ele é a consequência natural de um sistema em que quase todos os agentes – médicos, hospitais, laboratórios, fabricantes de tecnologias etc. – são remunerados não pela qualidade de vida dos pacientes, mas pela quantidade de serviços prestados. Assim como é natural que, tanto para esses agentes como para o público em geral, a percepção de que o sistema "funciona" seja proporcional ao quanto de cuidado é dispensado, mais do que por sua efetividade.
Na penúltima semana de novembro de 2016, na Cinelândia, uma fila de quase sessenta homens aguarda a realização do exame de próstata em "consultórios" improvisados em um ônibus estacionado. A ação faz parte da Semana da Saúde, promovida pela Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro, que inclui também ações educativas e exames de pressão. Como me explicaria mais tarde Ronaldo Damião, um dos coordenadores do evento, "a ideia inicial era ministrar palestras sobre a saúde do homem. Aí surgiu a ideia de fazer o PSA e o exame da próstata. Mas nós não esperávamos tanta gente". Damião conta que a expectativa era realizar no máximo 400 exames ao longo de três dias. Ao final do evento, tinham sido 1555.
Os homens na fila carregam folhetos que, previsivelmente, informam que o tratamento precoce do câncer de próstata só é possível através da realização de exames periódicos de toque retal e de PSA. Uma vez colhido o sangue, as amostras são mandadas para a Policlínica Piquet Carneiro, e os pacientes com exames alterados serão chamados. "Se houver um número muito grande de pacientes, a gente já combinou de encaminhar para outros hospitais, e acho que vai precisar", comenta Damião. Quando pergunto se ele repetiria esse tipo de ação, ele responde: "Não sei, a gente tem que discutir. É uma responsabilidade muito grande: se você começa a diagnosticar mais gente do que pode tratar, como é que vai fazer?"
A pergunta leva a outra, ainda mais complicada: Por que, no epicentro de uma brutal crise financeira, o estado do Rio de Janeiro levanta a bandeira do rastreamento do câncer de próstata, uma prática tão custosa quanto controversa? O secretário de Saúde, Luiz Antônio Teixeira, é tácito: "A gente tinha que fazer algum tipo de ação para o Novembro Azul, que faz parte do calendário nacional", explica – embora o "calendário" seja ditado pelo Instituto Lado a Lado pela Vida, e não por qualquer ação governamental. Dito isso, Teixeira confessa que houve polêmica com a área técnica da Secretaria: "A menina da atenção básica quase morreu: ‘Pelo amor de Deus, vamos suspender isso’, ela me disse."
"A campanha dá muita visibilidade política", diz Arn Migowski, epidemiologista do Inca. Ele aponta que a demanda gerada pelo rastreamento seria astronômica: com quase 1,5 milhão de candidatos ao rastreamento no Rio, seguir à risca a cartilha do Novembro Azul significaria, pelas minhas contas, em torno de 20 mil biópsias de próstata e 5 mil diagnósticos de câncer adicionais por ano, além de dezenas de milhares de consultas. Mas a realização dos exames por si só já conta. Como coloca Migowski, "os governos gostam de dizer que fizeram tantas mamografias, tantos exames de próstata. É uma coisa boa de se falar".
Do outro lado do Atlântico, em Londres, numa manhã gelada de fevereiro deste ano, Iona Heath, ex-presidente do Colégio Real Britânico de Médicos Generalistas, me diria o mesmo: "Nosso governo acha que as pessoas gostam de fazer check-ups regulares, então a cada eleição eles trazem isso de volta. Mas sempre haverá recursos limitados, e nós deveríamos dar prioridade às pessoas que estão doentes. É perda de tempo atender quem está perfeitamente bem e não deveria estar falando sobre sua saúde, e sim a usando para alguma coisa."
Se a medicina preventiva pode reduzir o medo, porém, ela não estaria fazendo algum bem às pessoas? Heath refuta o argumento com o exemplo da ultrassonografia obstétrica. "Para os 95% das mulheres que tiverem um resultado normal, ter feito o exame terá sido ótimo. Mas para os outros 5% a experiência será devastadora. Para poder tranquilizar quem está bem, nós nos permitimos fazer mal a uma minoria, que ficará paralisada de medo por alguma anormalidade que em geral não significa nada." Concordo, mas comento que indivíduos saudáveis são mais numerosos do que os doentes – e que se 95% das pessoas estiverem felizes com algo, isso é suficiente para ganhar uma eleição, até porque os outros 5% talvez não estejam em condições de votar. Ela rebate sem dó: "Essa é uma visão extremamente cínica para alguém da sua idade."
No ensaio Doença como Metáfora, de 1978, Susan Sontag descreve como o câncer obteve a conotação de "predador invencível e maligno", associado quase inevitavelmente à letalidade. Herdando a aura de maldição associada à tuberculose no século XIX, a palavra "câncer" tornou-se uma metáfora para os piores males, e foi tabu durante boa parte do século XX. Não por acaso, o linguajar associado ao tratamento recorre a metáforas bélicas. Há décadas fala-se da "guerra contra o câncer"; pacientes "lutam" contra a doença, os que sobrevivem a "vencem". Artigos recentes, aliás, sugerem que a contenda vem sendo cada vez mais travada como os conflitos americanos no Oriente Médio – na impossibilidade de eliminar o "inimigo", tenta-se contê-lo a longo prazo para minimizar danos.
É quase impossível, assim, passar ao público a ideia de que, como diz Juan Gérvas, "todos os seres humanos têm ou terão câncer" ou que "ter um câncer é normal" – mesmo que esse pareça ser o caso com base nos estudos de autópsia. A metáfora do inimigo invisível está arraigada e, para a maior parte das pessoas – inclusive para os médicos, quando o assunto é o próprio corpo –, a convivência pacífica com ele é difícil. Seria ingênuo, portanto, atribuir os excessos cometidos em nome do rastreamento apenas a interesses econômicos. No fundo, o anseio pelo diagnóstico precoce vem dos próprios pacientes.
Alguns estudos na década de 80 investigaram o efeito da prescrição de exames e da realização de check-ups na percepção de bem-estar dos indivíduos. Em geral, pacientes encaminhados a um exame diagnóstico expressam o desejo de realizá-lo, seja para "entender de uma vez por todas o que está errado", seja para descartar uma doença séria. Coincidência ou não, o mero pedido de um exame pode promover um efeito terapêutico – num estudo de pacientes com dores no peito, aqueles que haviam recebido um eletrocardiograma e uma dosagem de enzimas cardíacas para investigar um infarto haviam voltado mais rápido às atividades usuais.
"Exames são como mágica. Mágica investida de ciência, aliás, o que amplia seu poder", especula Iona Heath. "Trabalhamos num solo fértil de medo existencial. Todos tememos o desastre, e é esse sentimento que será explorado." No fim das contas, não é um despautério pensar que esse medo seja o motor mais poderoso da roda que faz girar a economia do câncer de próstata. "Desde o início dos tempos sabemos que, se você fizer as pessoas terem medo de alguma coisa, você pode vender algo a elas", diz a médica. "No passado, charlatões isolados cuidavam disso, mas agora o negócio funciona em escala corporativa."
Aos olhos de um cético, o apelo da prevenção não difere tanto daquele que move as religiões – cada qual a seu modo, elas fornecem soluções para lidar com a incerteza e dar ordem à aleatoriedade do mundo. A ideia de que somos responsáveis por nossa saúde – e que, se cuidarmos dela, seremos recompensados no futuro – está imbuída de uma boa dose de abnegação cristã, e da promessa de salvação a quem cumprir os rituais. Mais do que isso: nas últimas décadas, a "ética protestante" da prevenção vem se revestindo de uma aura de dever moral.
Talvez por esse motivo, ao conversar com os defensores do Novembro Azul – pacientes que se sentem curados após um exame de PSA ou indivíduos engajados na campanha – sempre tive dúvidas sobre até que ponto eu teria o direito de questionar suas convicções. Dúvidas não tão diferentes, no fundo, das que me ocorrem ao argumentar com pessoas que creem em um poder superior. É muito mais reconfortante para um paciente operado de câncer de próstata crer que sua vida foi salva pela medicina do que pensar que sua impotência se-xual se deve a um exame desnecessário. E ao me ver frente a frente com a situação, dizer o contrário parece tão canhestro quanto pregar o ateísmo numa igreja.
Ao mesmo tempo, talvez seja mais cômodo se sentir protegido pela medicina do que se saber sujeito aleatoriedade cruel da existência – por mais que boa parte das doenças vá ocorrer independentemente do que façamos. Iona Heath, porém, tem outra opinião: "A história recente da medicina tem mostrado o que acontece quando você tenta ter mais certezas do que pode. Essas certezas têm um preço, e é um preço alto. Alto para os doentes, alto para os que têm exames falsos positivos, mas também para todos nós, pela confiança que perdemos em nós mesmos", ela diz, orgulhosa de nunca ter feito uma mamografia.
Ao ouvi-la, tendo a simpatizar com sua visão – a incerteza parece bela, sobretudo na sala de uma casa aquecida em Londres, com tempo para filosofar sobre a vida. Mas também sei que nós dois temos sorte. E que há de ser mais complicado explicar a beleza do incerto aos 3 mil refugiados sírios que o governo britânico acaba de anunciar que irá recusar em suas fronteiras. No fim das contas, aceitar a aleatoriedade da existência é um privilégio concedido aos poucos para quem ela sempre representou mais oportunidade do que ameaça. E as razões que fazem com que alguns de nós o recebam são, como as de tantos outros privilégios, tão injustas e aleatórias quanto a própria vida.
Ao sair da palestra sobre câncer de próstata na Beneficência Portuguesa, tiro o adesivo do "Bigode também pode" colado em meu peito e subo a rua Maestro Cardim em direção à avenida Paulista. Em meio a outdoors do Novembro Azul, músicos de rua passam chapéus, anunciantes entregam filipetas e artesãos com dreadlocks vendem miçangas. O sujeito de bata e touquinha da Jamaica não possui evidências científicas de que o artesanato que vende prolonga ou melhora a vida de alguém. Mesmo assim, não há nenhum entusiasta da prevenção quaternária contestando seu direito de vendê-las. Pelo contrário, todos nos acomodamos dentro de um sistema que gira em torno de produzir necessidades, mais do que satisfazê-las.
Ao passar sob os pilotis do Museu de Arte de São Paulo (Masp), sou surpreendido por uma senhora de jaleco branco com um estetoscópio, que me aborda dizendo "pressão?". E é só depois do susto inicial que percebo que, como uma versão mambembe do Novembro Azul, ela tenta me vender uma medida de pressão arterial. Antes que eu consiga me opor, ela já está enrolando o esfigmomanômetro em meu braço, dizendo que me manda embora se eu estiver bem, e que chama o socorro ou a polícia se não estiver.
Enquanto o aparelho aperta minhas artérias, deixando minha mão dormente, ela conta que é técnica em enfermagem aposentada, e que trabalha para ajudar a bancar a faculdade de medicina da filha, mostrando um boleto bancário de mais de 6 mil reais. Se ela de fato sustenta a conta assim, é um feito e tanto. Ao terminar, ela diz que as pes-soas costumam contribuir com 10 reais. Eu reclamo e ela diz, "Ah, então deixa 6 ou 7". Eu ofereço 5, que ela apanha sem pestanejar, para logo depois dizer que a pressão está ótima, 12 por 7.
Argumento que 5 reais ainda é caro, mas ela replica que, pelo Conselho Regional de Enfermagem, a medição deveria custar 13 reais, e que ela dá o desconto só porque é autônoma. Quando digo que sou médico, ela pergunta: "E você não cobra a consulta, por acaso?" Na verdade, não, respondo. Mas cobro pela história que estou tentando contar – a qual tampouco tenho como provar que vai melhorar a vida de alguém. Explico sobre o livro que estou escrevendo, mas ela não parece querer falar muito mais, e pede que eu não cite seu nome. "Pode me identificar como Vó Dadá, guerreira." Eu pergunto onde ela trabalhava quando era ativa, e ela responde: "Na Beneficência Portuguesa."
Fonte: http://bit.ly/2N2pQD6
O Dr. Olavo Amaral merece um prêmio por este texto surpreendente. Ele abre os nossos olhos para enxergar as várias faces da tão aclamada "prevenção" que no final das contas é mais detecção. Sobre prevenção mesmo pra valer não tem mês estabelecido. O autor tem alguns livros de ficção e poesia no site Amazon. Parabéns pela postagem! Quero divulgar sempre. ;)
ResponderExcluirRealmente é um texto que abre nossa mente em relação a este importante tema. Obrigado pela dica!
Excluir"Todos nos acomodamos dentro de um sistema que gira em torno de produzir necessidades, mais do que satisfazê-las".
ResponderExcluirDr. Olavo Amaral